quinta-feira, 30 de agosto de 2012

TST analisa 'degustação' na indústria do cigarro


Procurador-geral do trabalho Luis Antônio Camargo de Melo: "A empresa deve buscar meios adequados para verificar a qualidade do produto".
 


O Tribunal Superior do Trabalho (TST) começou a julgar um pedido de condenação de R$ 1 MILHÃO contra a Souza Cruz pelo uso de funcionários na DEGUSTAÇÃO de cigarros. Na ação, o Ministério Público do Trabalho (MPT) quer que a Justiça proíba o chamado "painel sensorial do fumo".

Polêmica, a discussão divide a opinião de magistrados. Já tomou também a atenção de advogados. Eles entendem que a futura decisão terá impacto sobre as indústrias de bebidas, alimentos e cosméticos, que alocam empregados para experimentar e fazer o controle de qualidade de seus produtos.

O próprio TST já condenou, em 2008, a Ambev a indenizar um funcionário ALCOÓLATRA que teve a doença agravada por degustar cerveja durante 15 anos. Uma indústria de Porto Alegre, especializada em alimentos prontos, foi obrigada a pagar R$ 30 mil por dano moral a uma empregada responsável por provar os lanches produzidos. Ela se tornou obesa durante o contrato de trabalho.

Advogados trabalhistas afirmam ainda que A DECISÃO PODERÁ SER PRECEDENTE PARA REGULAR NORMAS DE SEGURANÇA DO TRABALHO. Citam os setores de aviação e petróleo, que utilizam mão de obra em atividades perigosas, como no abastecimento de aeronaves e no mergulho de altas profundidades para exploração e manutenção dos poços de petróleo. "O julgamento é histórico pelo impacto e pelas teses defendidas", diz o advogado Fabrício Trindade Sousa, do Demarest e Almeida Advogados.

Denunciado em 2002, o painel sensorial do fumo serve para o controle da qualidade dos cigarros produzidos pela Souza Cruz. "Máquina nenhuma consegue diferenciar o teor e sabor das folhas do tabaco. Há necessidade de uniformização do gosto", afirma o advogado Mozart Victor Russomano Neto, do Russomano Advocacia, que defende a empresa. A fabricante alega que os empregados são voluntários e fumantes há mais de dois anos.

Para o MPT, porém, HÁ UM INCENTIVO AO VÍCIO. "A empresa deve buscar meios adequados para verificar a qualidade do produto, sem afetar a saúde do trabalhador", diz o procurador-geral do trabalho, Luis Antônio Camargo de Melo. A procuradoria argumenta ainda que os funcionários teriam contato também com os produtos de concorrentes da Souza Cruz. "Eles experimentam drogas e dosagens que nem mesmo o empregador conhece", afirma Melo. A Souza Cruz se defende com o argumento de que os funcionários NÃO TRAGAM a fumaça, apenas a mantém na boca para sentir a textura e amargura do tabaco.

O uso de empregados na degustação do cigarro FOI PROIBIDO pela 7ª Turma do TST no ano passado. Na ocasião, porém, não determinaram o pagamento de indenização por danos morais coletivos. Como houve recursos da empresa e do MPT, 12 ministros da 1ª Seção Especializada em Dissídios Individuais (SDI-I) - responsável por uniformizar a jurisprudência da Corte - deverão dar a palavra final sobre o caso.

Três soluções foram propostas no início do julgamento, suspenso pelo pedido de vista da ministra Delaíde Miranda Arantes. Os ministros Augusto César de Carvalho, relator do caso, e José Roberto Pimenta defenderam a PROIBIÇÃO DA ATIVIDADE e PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO por danos morais coletivos aos trabalhadores. Mas para o ministro Ives Gandra Martins Filho, a Souza Cruz não pode ser prejudicada. Isso porque a ADESÃO dos funcionários à degustação seria VOLUNTÁRIA e o Judiciário incompetente para vedar uma atividade lícita.

Como alternativa, o ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho sugeriu uma ESCALA DE TRABALHO para os provadores. Os funcionários da fabricante de cigarros exerceriam a função durante seis meses e se afastariam da tarefa pelos três meses seguintes. Durante o período de atividade, teriam direito a descanso de uma semana para cada duas de trabalho.

O acordo, no entanto, foi REJEITADO pela procuradoria do trabalho. A Souza Cruz, por outro lado estaria disposta a cumprir a exigência. "Porém, também defendemos que a Justiça não pode restringir uma atividade lícita", diz Russomano, acrescentando que a Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), do Ministério do Trabalho, prevê a atividade de "PROVADOR DE CHARUTO".

A seu favor, a Souza Cruz cita decisão do TST do início dos anos 2000 que teria negado uma ação que queria proibir a atividade de abastecimento de aeronaves. De acordo com Ricardo Gentil, advogado do Sindicato Nacional dos Aeroviários (SNA), a Justiça já reconheceu, porém, o direito ao adicional de periculosidade para os funcionários de companhias aéreas e empresas de apoio que acessam o pátio de manobra das aeronaves, onde é realizado o abastecimento. "Algumas companhias estão contratando com salário menor para pagar adicional de 30% sobre a remuneração", afirma.

Outros oito ministros da SDI-I vão se pronunciar sobre o caso da Souza Cruz. Advogados analisam, contudo, que independentemente da decisão, o caso poderá ser levado ao Supremo Tribunal Federal (STF). "A Justiça terá que decidir o que prepondera, A LIVRE INICIATIVA ou O DIREITO À SAÚDE", diz Daniel Chiode, advogado do escritório Gasparini, De Cresci e Nogueira de Lima.

"É UM CONFLITO ENTRE DUAS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS."

Por Bárbara Pombo | De Brasília
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