quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Ficha de Informações de Segurança de Produtos Químicos e a responsabilidade social das empresas


A garantia da segurança e a preservação da saúde de trabalhadores e usuários dos produtos da construção civil, bem como a conservação da qualidade do meio ambiente são responsabilidades fundamentais de toda a cadeia produtiva. A simples informação a todos os envolvidos e a capacitação dos recursos humanos de procedimentos de execução e de emergência podem reduzir o risco de doenças e acidentes ocupacionais, bem como evitar a contaminação do ambiente. A segurança e saúde ocupacional dependem da postura preventiva das empresas e de suas equipes, que devem se pautar em informações objetivas para avaliação dos riscos. 

Ficha de Informações de Segurança de Produtos Químicos (FISPQ, em inglês SDS - Safety Data Sheet) é o documento que organiza as informações relevantes sobre os riscos dos produtos para os seres humanos, seres vivos e para o ambiente; os procedimentos de manipulação dos produtos, de descarte de resíduos; recomenda formas de minimizar eventuais efeitos prejudiciais sobre a saúde e o ambiente, bem como as ações em caso de acidentes.

Fonte: UN (2011).
Figura 1 - Pictogramas do GHS. Da esquerda para a direita: meio ambiente, perigoso à saúde (ex.: carcinogenicidade), chama, ponto de exclamação (ex.: irritante à pele), chama sobre o círculo (oxidantes), crânio e ossos cruzados (toxicidade aguda), cilindro de gás (gases sob pressão), corrosão, bomba explodindo (explosivos)
Sem as FISPQs não é possível estabelecer estratégias eficazes de segurança no trabalho nem informar aos usuários (que muitas vezes também serão responsáveis pela manutenção) sobre eventuais riscos. Segundo a Organização Internacional de Trabalho (OIT), o trabalhador tem o direito de receber as informações sobre a periculosidade dos produtos com os quais entra em contato no ambiente de trabalho. A ausência da FISPQ é, também, um desrespeito ao direito dos trabalhadores. Portanto, não é possível definir práticas de construção sustentáveis sem incluir medidas consistentes de proteção à vida da equipe e dos usuários.

Recentemente, a ONU estabeleceu o Sistema Globalmente Harmonizado de Classificação e Rotulagem de Produtos Químicos (GHS) (Abiquim, 2005), que padroniza as FISPQ internacionalmente. No Brasil, a Norma Regulamentadora no 26 (NR 26) do Ministério do Trabalho e do Emprego, revisada em 25/5/2011, estabeleceu a obrigatoriedade da adaptação das FISPQ ao GHS a partir de 1/6/2015 no caso de misturas. Para substâncias simples, o prazo de atualização das FISPQs já expirou.
Antecipando-se a essa determinação, algumas empresas do setor da construção civil já disponibilizam as FISPQs atualizadas com todo conteúdo exigido pelas Normas. Mas essas empresas ainda são exceção, sendo que na prática apenas uma pequena fração dos produtos da construção brasileiros conta com as FISPQs.

Essa é uma primeira iniciativa no campo da chamada segurança química, que está diretamente ligada à qualidade de vida da população e que conceitualmente engloba questões como controle e prevenção dos efeitos adversos ao ser humano e ao meio ambiente em todo o ciclo de vida do produto, compreendendo extração, produção, armazenagem, transporte, manuseio, uso e descarte final de produtos e seus resíduos. Pela relevância da FISPQ na gestão responsável do empreendimento, contribuindo para segurança de pessoas e ambiente, a ferramenta deve ser assimilada pelo setor de construção civil por parte de fabricantes, construtoras e consumidores.

A importância da FISPQ
Para a adoção da FISPQ pelo setor de construção civil, é relevante que primeiramente seja definido o que é produto químico, ou seja, quais são os materiais de construção que podem ser assim classificados, em função do grau de segurança necessário para seu uso e manipulação. Infelizmente, não existe regra muito clara para essa definição, sendo responsabilidade do fornecedor do material identificar e alertar sobre os perigos associados aos seus produtos. 

A "ficha com dados de segurança" é um documento que, segundo o Decreto Federal no 2.657 de 3/7/1998, deve ser recebido pelos empregadores que utilizem produtos químicos classificados como perigosos. Atualmente, no Brasil, o modelo de FISPQ é definido pela norma brasileira NBR 14.725 - Produtos Químicos - Informações sobre Segurança, Saúde e Meio Ambiente (ABNT, 2009). Essa norma técnica tem o objetivo de apresentar informações para a elaboração e preenchimento de uma FISPQ, e define que o documento deve conter 16 seções obrigatórias, obedecendo numeração e sequência padronizadas.

Marcelo Scandaroli
Figura 2 - Pela relevância da FISPQ na gestão responsável do empreendimento, contribuindo para segurança de pessoas e ambiente, a ferramenta deve ser assimilada pelo setor de construção civil por parte de fabricantes, construtoras e consumidores
A elaboração da FISPQ inicia com a escolha de um sistema de classificação de perigos. Esse sistema estabelece critérios para o enquadramento em classes quanto aos perigos físicos, à saúde humana e ao meio ambiente. O resultado dessa classificação, presente na seção 2, norteia o preenchimento de todo documento. A seção 14 também preconiza a utilização de sistema de classificação para o correto preenchimento de informações pertinentes ao transporte de produtos químicos perigosos. Existem sistemas de classificação de perigos já consolidados e difundidos. Os sistemas europeus (Diretivas Europeias e CLP - Classification, Labelling and Packaging); o norte-americano para identificação de riscos de incêndio (Diagrama de Hommel/ NFPA - National Fire Protection Association) e a regulamentação canadense para produtos controlados. O sistema GHS/ONU Globally Harmonized System of Classification and Labelling of Chemicals (UM, 2011) é um sistema acordado internacionalmente com o apoio do governo brasileiro que harmoniza a classificação e rotulagem de substâncias químicas e misturas de acordo com os perigos físicos à saúde e ao ambiente e padroniza a comunicação dos riscos, incluindo pictogramas para rotulagem e o conteúdo das fichas de segurança. Produto de um acordo internacional vem sendo paulatinamente adotado pelos países. A NBR 14.725:2012 constitui parte do esforço brasileiro para a aplicação do GHS como sistema de classificação e rotulagem de produtos químicos, que é recomendado pelo Conselho Brasileiro de Construção Sustentável (CBCS).

Além da divulgação da FISPQ, é exigido do fabricante que a rotulagem da embalagem do produto utilize elementos de comunicação que incluam: pictogramas (figura 1), palavra de advertência, frases de perigo e frases de precaução, que têm por objetivo alertar os usuários dos cuidados necessários durante o uso e facilitar o acesso a ações recomendáveis em casos de acidente, de forma a minimizar ainda mais os riscos. Embora a FISPQ seja um documento informativo sobre os perigos do produto comercializado, os riscos inerentes ao uso do produto podem ser minimizados com a utilização de equipamentos de proteção individual (EPI), controles de engenharia e práticas de gestão segura no manuseio, no armazenamento e no descarte do produto químico.

Adoção da FISPQ no setor da construção
 
Um dos desafios da adoção da FISPQ no setor de construção está na definição dos produtos que demandam sua elaboração. O critério principal é a existência de componentes perigosos ou quando os usos previstos ou recomendados derem origem a riscos à segurança e saúde dos trabalhadores. Assim, a decisão depende de análise da composição do produto e da identificação do risco associado.

Como não existe uma lista brasileira de substâncias perigosas harmonizada de acordo com os critérios do sistema GHS, a NR 26 recomenda o uso de listas internacionais, como por exemplo, podemos citar a base de informações sobre produtos químicos da European Chemicals Agency (ECHA) e do Institute for Health and Consumer Protection (IHCP), ambos da Comunidade Europeia, bem como a lista da Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer (IARC).

Os materiais de construção podem apresentar substâncias classificadas como perigosas, como exemplo a sílica cristalina presente na maioria dos cimentícios, e nesse contexto se faz sempre necessária a avaliação da concentração dessas substâncias no produto comercializado, como também a forma e o grau de exposição do usuário.

Dúvidas sobre a FISPQ
As orientações citadas neste artigo não caracterizam obrigações de qualquer natureza. Tratam-se, apenas, das opiniões de alguns especialistas para as dúvidas que surgiram durante os diálogos técnicos que nortearam a elaboração da Norma Brasileira.

O que é FISPQ?
A Ficha de Informações de Segurança de Produtos Químicos é um documento que possui informações essenciais sobre os riscos inerentes a misturas e substâncias químicas. As instruções de elaboração e o modelo de FISPQ no Brasil são definidas pela norma NBR 14.725 - Parte 4.

Para que serve uma FISPQ?
Como se trata de um documento com informações técnicas, os leitores (profissionais técnicos) podem utilizar seu conteúdo para desenvolver avaliações de risco que permitam a aplicação de um programa ativo de segurança, saúde e meio ambiente, incluindo treinamentos aos usuários dos produtos.

Marcelo Scandaroli
Figura 3 - A FISPQ é um documento com informações técnicas, cujo conteúdo pode servir de embasamento técnico de avaliações de risco para que profissionais desenvolvam e apliquem um programa ativo de segurança, saúde e meio ambiente, incluindo treinamentos aos usuários dos produtos
A NBR 14725 Produtos Químicos - Informações sobre Segurança, Saúde e Meio Ambiente é aplicável à indústria de materiais de construção?
As normas para a classificação e para a rotulagem de produtos químicos são aplicáveis para todo produto químico, incluindo a indústria de materiais de construção. Somente para os setores que já possuem regulamentação específica com essa finalidade o sistema ainda não está sendo aplicado, como exemplo, setores já regulamentados pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento ou pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Quais produtos e materiais precisam de FISPQ no setor de materiais de construção?
De acordo com o Decreto no 2.657/98 e a Portaria no 229/11 do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), todo produto químico classificado como perigoso de acordo com o Sistema Globalmente Harmonizado de Classificação e Rotulagem de Produtos Químicos (GHS) deve possuir FISPQ. A ficha também será exigida para produto químico não classificado como perigoso, mas cujos usos previstos ou recomendados derem origem a riscos à segurança e saúde dos trabalhadores, como materiais diversos que, ao serem manipulados e cortados, geram poeira volátil passível de ser inspirada ou substâncias absorvidas pela pele.
Podem ser citados alguns exemplos de produtos que exigem FISPQ para materiais de construção, sólidos ou líquidos, tais como:

- Adesivos
- Materiais particulados (fíleres e adições minerais, como sílica ativa, metacaulim, cinzas, escória, etc.)
- Argamassas, grautes e concretos ensacados
- Cal hidratada
- Cimentos e outros ligantes
- Espumas de vedação
- Fibras sintéticas e minerais
- Gesso
- Pigmentos
- Aditivos de concreto
- Agentes de cura de concreto
- Selantes e vedantes
- Desmoldantes
- Hidrofugantes
- Impermeabilizantes
- Combustíveis (diesel, querosene, etc.)
- Biocidas em geral, tais como isotiazolona, carbendazina, carbamatos, CCA (cromo, cobre, arsênio) ou CCB (cromo, cobre, boro), bem como materiais tratados
- Solventes, removedores e limpadores em geral como: limpadores de placas cerâmicas, ácido clorídrico, etc.
- Resinas
- Tintas
- Vernizes

Estes exemplos gerais são citados devido à composição prevista apresentar produtos químicos reconhecidamente perigosos, no entanto, uma avaliação deve ser feita caso a caso, com cada produto, levando em consideração a composição química (concentração de cada ingrediente) e a forma de apresentação do produto.

Quem são os agentes responsáveis pela elaboração e utilização das informações presentes em uma FISPQ?
O fabricante ou, no caso de importação, o fornecedor do produto químico no mercado nacional deve elaborar e tornar disponível a FISPQ aos seus clientes ou usuários dos produtos. Enquanto que o usuário do produto químico é responsável por agir de acordo com uma avaliação de riscos, tendo em vista as condições de uso do produto, assegurar o acesso dos trabalhadores às FISPQ e por manter os trabalhadores informados quanto aos perigos relevantes nos seu local individual de trabalho.

Que tipos de informações são encontradas numa FISPQ? Quais seções são obrigatórias na FISPQ? 
A FISPQ possui 16 seções obrigatórias onde são encontradas informações sobre: limite de exposição (para efeitos toxicológicos); como descartar resíduos do produto; identificação dos perigos; como minimizar os riscos (quais equipamentos de proteção individual (EPI) devem ser utilizados); se o produto é classificado como perigoso para o transporte ou não, recomendações de emergência (incêndio, ingestão, derramamento ou vazamento, etc.), entre outros. Nomes, numerações e sequência das 16 seções obrigatórias não podem ser alterados, sendo eles:

1) Identificação
2) Identificação de perigos
3) Composição e informações sobre os ingredientes
4) Medidas de primeiros socorros
5) Medidas de combate a incêndio
6) Medidas de controle para derramamento ou vazamento
7) Manuseio e armazenamento
8) Controle de exposição e proteção individual
9) Propriedades físicas e químicas
10) Estabilidade e reatividade
11) Informações toxicológicas
12) Informações ecológicas
13) Considerações sobre disposição final
14) Informações sobre transporte
15) Informações sobre regulamentações
16) Outras informações

Como elaborar uma FISPQ?
A FISPQ deve ser elaborada de acordo com a norma oficial vigente, NBR 14.725, Parte 4. "Os textos devem ser escritos em português (Brasil), de forma legível, em linguagem compreensível, de maneira clara e concisa. Frases comuns são recomendadas."

A elaboração de FISPQ é obrigatória no Brasil? Existe punição por não se fazer a FISPQ?
O Decreto no 2.657 de 1998, que ratificou no Brasil a convenção 170 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), estabelece a obrigatoriedade do fornecimento da FISPQ para o trabalhador. A Portaria no 229 de 2011/ MET, que altera a Norma Regulamentadora NR 26, que trata de Sinalização de Segurança, exige que o fabricante ou o fornecedor elabore e torne disponível a FISPQ para todo produto.


Fabriciano Pinheiro
diretor de gerenciamento de risco toxicológico da Intertox
fabriciano@intertox.com.br
Andressa Baldi
coordenadora de P&D na Weber Saint-Gobain
andressa.baldi@saint-gobain.com

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