“Prevenir acidentes é dever moral” O presidente do
Tribunal Superior do Trabalho, ministro Carlos Alberto Reis de Paula.
O presidente do Tribunal Superior do Trabalho, ministro Carlos Alberto
Reis de Paula, considera "um dever moral" a adoção de medidas de
prevenção de acidentes de trabalho. A declaração foi feita nesta quarta-feira
(18), em discurso na abertura do II Seminário Nacional de Prevenção de
Acidentes de Trabalho. "Por detrás da fria estatística, há muitas
lágrimas, revoltas e emoções desencontradas. Em milhares de residências
brasileiras, vamos encontrar uma cadeira vazia, sonhos desfeitos, órfãos
desamparados e muitos corações afetuosos na dor da saudade. Não podemos mesmo
ficar indiferentes", disse o ministro.
Leia abaixo a íntegra do discurso.
A partir de 2005 a Justiça do Trabalho passou a julgar as ações
indenizatórias oriundas dos acidentes do trabalho, em decorrência da promulgação
da Emenda Constitucional n. 45.
Após alguns anos dessa vivência judicial na análise das reparações de
danos decorrentes do acidente de trabalho e da doença ocupacional,
algumas perguntas e perplexidades passaram a nos incomodar:
– passaremos nossas vidas profissionais apenas julgando os pedidos
indenizatórios? Ou poderemos ter uma atuação proativa, discutindo com a
sociedade e outros atores envolvidos, sobre as possibilidades de interferir nos
fatores causais para prevenir os acidentes ou tornar menos nefastas as suas
consequências?
– poderemos contribuir de algum modo para mudar ou pelo menos atenuar o
problema acidentário no Brasil?
A persistência dessas perguntas conduziu a uma tomada de posição.
Agora, já não temos mais dúvidas de que a Justiça do Trabalho pode
colaborar para garantir um meio ambiente do trabalho seguro e saudável. O
magistrado trabalhista também está comprometido com as diretrizes que colocam
em destaque a dignidade da pessoa humana, o valor social do trabalho e a
redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene
e segurança do trabalho, princípios insculpidos solenemente na Constituição da
República de 1988.
Assim é que desde 2011 a Justiça do Trabalho vem atuando, em conjunto
com diversos órgãos públicos e com a sociedade em geral, na implementação de
programas e ações voltados à prevenção de acidentes do trabalho e ao
fortalecimento da Política Nacional de Segurança e Saúde no Trabalho. Para
cumprir esses objetivos, foi assinado um "Protocolo de Cooperação
Técnica" com :
1. Ministério do Trabalho e Emprego;
2. Ministério da Previdência Social;
3. Ministério da Saúde;
4. Advocacia Geral da União;
5. Ministério Público do Trabalho
6. FUNDACENTRO
7. Instituto Nacional de Seguro Social - INSS
Estamos promovendo reuniões periódicas para compartilhar informações e
estudar medidas que possam aumentar a efetividade das normas de prevenção.
Também estamos formulando propostas conjuntas para aprimoramento da legislação
e da regulamentação a respeito da segurança, higiene, saúde e meio ambiente do
trabalho.
Uma das iniciativas bem sucedidas dessa parceria foi o ajuste pactuado
para o encaminhamento à Procuradoria Geral Federal de cópias das sentenças e
dos acórdãos, que tenham reconhecido a conduta culposa do empregador no
acidente do trabalho, de modo a subsidiar ajuizamento de ação regressiva
em face do empregador, conforme previsto no art. 120 da Lei n. 8.213/91.
A Previdência Social paga os benefícios acidentários às vítimas, mas
busca a recuperação dos valores desembolsados junto ao causador do acidente: o
empregador descuidado do cumprimento das normas de segurança e saúde no
trabalho. Somente em 2013 foram enviados eletronicamente à
Procuradoria-Geral Federal 2.953 ofícios que resultaram em centenas de ações regressivas
ajuizadas. Merece destaque, nesse particular, a atuação do Juiz do
Trabalho da 1ª Vara do Trabalho de Chapecó em Santa Catarina, Dr. Carlos
Frederico Fiorino Carneiro, que este ano já enviou eletronicamente 125
ofícios.
Outra iniciativa importante foi a instituição, em caráter
permanente, do "Programa Trabalho Seguro" no âmbito da Justiça do
Trabalho, por intermédio da Resolução do Conselho Superior da Justiça do
Trabalho – CSJT n. 96/2012. Essa Resolução teve o grande mérito de criar a
gestão regional do Programa Trabalho Seguro em todos os 24 Tribunais Regionais.
Atualmente a Justiça do Trabalho conta com dois magistrados em cada Região, que
estão dialogando e colaborando com as instituições parceiras locais, para
viabilizar ações conjuntas de prevenção de acidentes do trabalho.
O Programa Trabalho Seguro ganhou reconhecimento público como uma
prática inédita e bem sucedida do Poder Judiciário, tanto que foi condecorado
com o destacado prêmio INNOVARE em 2012.
Contamos hoje na Justiça do Trabalho com 6 gestores nacionais do
Programa Trabalho Seguro e 48 gestores regionais. Temos, portanto, 54
magistrados trabalhistas, vocacionados e idealistas, que abraçaram com
entusiasmo a gestão do Programa Trabalho Seguro. Esse trabalho persistente já
está produzindo muitos resultados positivos. A prevenção de acidentes e doenças
ocupacionais ganhou mais espaço na mídia, despertou a atenção da sociedade e
repercutiu nos meios acadêmicos e na doutrina especializada.
Atualmente, estamos concentrando esforços em um novo foco específico,
buscando compreender as causas e vislumbrar as medidas cabíveis para
reduzir o número de acidentes no setor de transporte. Somente em 2012 o Brasil
registrou 102.396 acidentes de trajeto, número esse que vem crescendo
sistematicamente nas estatísticas, ano após ano. O elevado número de acidentes,
mutilações e mortes nos deslocamentos, da residência para o trabalho ou deste
para aquela, exige uma atuação mais efetiva de todos para buscar reverter essa
tendência lamentável.
Quando morre o trabalhador, quando ele é mutilado, não podemos ver
apenas um número, não podemos dar as costas e considerar que o operário
foi apenas mais um que "morreu na contramão atrapalhando o
tráfego". A experiência da dor deve nos guiar para prevenir,
para adotar cautelas, de modo que se evite que tais calamidades voltem a
ocorrer.
Em 2011 o Tribunal Superior do Trabalho promoveu o 1º Seminário Nacional
de Prevenção de Acidentes do Trabalho, com ricas exposições e debates que
contribuíram para a conscientização a respeito das medidas preventivas dos
acidentes do trabalho.
Em continuidade ao programa, estamos abrindo o 2º Seminário Nacional,
que de igual forma tem como enfoque principal a prevenção dos acidentes.
Aceitaram nosso convite os principais especialistas dos diversos ramos do
conhecimento, ligados ao mundo do trabalho, para proferir conferências e
participar dos painéis, com o propósito de identificar os problemas e apontar
os possíveis caminhos ou medidas viáveis para garantir o direito fundamental ao
meio ambiente do trabalho seguro e saudável.
A situação geral dos acidentes do trabalho no Brasil continua
preocupante. De acordo com os dados oficiais, ocorrem anualmente mais de 700
mil acidentes. A cada dia, se somarmos o número de mortes mais as
aposentadorias por invalidez permanente, por volta de 50 pessoas nunca mais
retornarão ao local de trabalho. E esses dados referem-se somente aos
trabalhadores abrangidos pelo seguro de acidente do trabalho, porquanto não
estão computados os acidentes sofridos pelos servidores estatutários, os
domésticos, os militares, os cooperados e os autônomos.
São números constrangedores. Por detrás da fria estatística, há muitas
lágrimas, revoltas e emoções desencontradas... Em milhares de residências
brasileiras vamos encontrar uma cadeira vazia, sonhos desfeitos, órfãos
desamparados e muitos corações afetuosos na dor da saudade... Não podemos mesmo
ficar indiferentes... Digo mais: a necessidade de aprofundar, tanto quanto
possível, nas medidas preventivas possíveis é um imperativo de consciência, um
dever moral!
Vale mencionar as palavras de Alexandre Marcondes Filho, que foi
Ministro do Trabalho do Presidente Getúlio Vargas, quando encaminhou o projeto
da terceira lei acidentária brasileira, o Decreto-lei n. 7.036 de 10 de
novembro de 1944:
"A vida humana tem, certamente, um valor econômico. É um capital
que produz, e os atuários matemáticos podem avaliá-lo. Mas a vida do homem
possui também valor espiritual inestimável, que não se pode pagar com todo o
dinheiro do mundo... Por mais que se despenda com a prevenção racional, ela
será sempre menos onerosa que o sistema de indenizações, ..."( )
Em cumprimento às propostas do Programa Trabalho Seguro, estamos
celebrando hoje mais um importante "Acordo de Cooperação Técnica" com
o Ministério do Trabalho e Emprego. Quando o juiz constatar a presença de
agente insalubre no local de trabalho, por intermédio de prova pericial, deverá
encaminhar ao Ministério do Trabalho cópia da sentença ou do acórdão que
condenou ao pagamento do adicional.
O Ministério do Trabalho e Emprego, diante dos ofícios recebidos,
compromete-se a planejar a ação fiscal estipulando prazo para o empregador
eliminar ou neutralizar o agente insalubre, conforme previsto no art. 191 da
CLT, dando prioridade aos casos reiterados envolvendo a mesma empresa ou
estabelecimento. Se não for viável tecnicamente a eliminação ou neutralização
do agente nocivo, deverá ser fixado o pagamento do adicional cabível, conforme
previsto no item 15.4.1.1 da Portaria n. 3.214/78 do referido Ministério.
Estamos certos de que este "Acordo de Cooperação Técnica" vai
colaborar para diminuir sensivelmente as ações judiciais em que se postula o
adicional de insalubridade, bem como vai assegurar para o trabalhador um
ambiente mais seguro e saudável, com a consequente redução das doenças
ocupacionais. Como se vê, trata-se de uma medida simples, sem qualquer custo
financeiro, mas com grande efeito prático em benefício da saúde do trabalhador.
Ouviremos em breve a Conferência Magna do eminente jurista Ingo Sarlet,
pelo que não mais me alongo. O que desenvolvemos nessa área, inclusive esse
Seminário, é resultado do trabalho coletivo de uma equipe dedicada e talentosa
de magistrados e servidores, sob a coordenação do Desembargador Sebastião
Geraldo de Oliveira. A Justiça do Trabalho lhes é grata.
Quero antes de concluir, desejar a todos o melhor proveito deste
Seminário e que as luzes que aqui serão lançadas possam clarear os caminhos que
conduzam à melhoria do meio ambiente do trabalho.
Muito obrigado.
Fonte: João Barbosa de
Souza Júnior
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