sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Estudo e trabalho são rotina para 70% dos presos de Instituto Penal de MS

Presídio de regime fechado em Campo Grande abriga 1.242 internos.

Local tem cerca de 600 vagas de trabalho e 250 para estudo, diz direção.

Gabriela Pavão Do G1 MS.

Estudo e trabalho são rotina para 70% dos presos de Instituto Penal de MS (Foto: Gabriela Pavão/ G1 MS).

Salas de aula, quadro negro, computadores, oficinas de móveis, padaria e biblioteca são ambientes que fazem parte da rotina dos presos do Instituto Penal de Campo Grande. Os muros altos, com arames farpados e guaritas de segurança, não impedem que os presos tenham acesso ao conhecimento.

De acordo com a direção da unidade, atualmente cerca de 70% dos 1.242 internos que cumprem pena no local estudam ou trabalham. Alguns fazem as duas atividades paralelamente e usam a remuneração do trabalho para pagar faculdade, como o preso que concluiu ensino superior dentro do regime fechado.

O local tem cerca de 600 vagas de emprego que vão desde marcenaria, cozinha e artesanato até funções administrativas. Para o estudo são cerca de 250 vagas, sendo 230 delas para cursar ensino fundamental e médio, segundo informou ao G1 a chefe da Divisão de Assistência Educacional da Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário (Agepen), Elaine Arima Xavier Castro.

Segundo a direção do presídio, oito internos da unidade fazem o curso de graduação a distância e 19 são alunos de cursos técnicos do Instituto Federal de Mato Grosso do Sul (IFMS). Em 2014, de acordo com Elaine, 254 presos frequentaram as salas de aula dentro do presídio para concluir os ensinos fundamental e médio.

Alunos formados no Instituto Penal de Campo Grande (Foto: Gabriela Pavão/ G1 MS)


O estudo é direito dos internos, segundo o diretor-adjunto do IPCG, Aud de Oliveira Chaves, e no caso deles é feito de forma presencial, para ensino fundamental e médio, e a distância, nos cursos de graduação e técnicos.

As aulas presenciais são ministradas por professores da escola estadual Polo Professora Regina Lúcia Anffe Nunes Betine. Em 2014, 12 alunos se formaram nas turmas de fundamental e médio, sendo 9 na primeira turma e 3 na segunda.

A capacidade total de alunos na escola do presídio é de 230 vagas. "O número de matriculados é maior do que número de vagas porque alguns acabam tendo regressão de pena durante o ano e saem do regime fechado, então as vagas voltam a ser abertas. Já o número de formados é menor porque alguns reprovam ou acabam desistindo também", explicou. Segundo ela, para 2015, as matrículas ainda não foram abertas.

Professora Celma com alunos do ensino fundamental e médio (Foto: Gabriela Pavão/ G1 MS).

Aos 40 anos, J. A., que pediu para ter somente as iniciais do nome divulgadas, concluiu o ensino médio dentro do presídio. Contando os dias para sair do regime fechado, ele disse ao G1 que pretende fazer faculdade de direito em 2015.

"Demorei, mas terminei o estudo básico, e agora não quero parar. Penso em fazer faculdade quando sair daqui", explicou. Ele foi orador da turma na cerimônia de colação de grau. No discurso feito perante os colegas de turma, professores e familiares, o preso falou sobre escolhas da vida e ajuda dos professores.

"O ontem não nos pertence mais e o amanhã não chegou ainda. Pensamos que o tempo seria perdido aqui dentro, mas encontramos na educação uma forma de usar o tempo para crescer e sair melhor", disse.

Dos presos da unidade, alguns estudam, outros trabalham e ainda tem aqueles que estudam e trabalham. É o caso de R.R., 40 anos, Douglas Igor da Silva Fernandes, 34 anos, e Izaelson Junior, 29 anos, que trabalham na parte administrativa do IPCG.

Os três são alunos do curso de Transações Imobiliárias do Instituto Federal de Mato Grosso do Sul e dois deles estão cursando o ensino superior; R.R. faz Marketing e Douglas cursa Processos Gerenciais.

Eles afirmam que a possibilidade de estudar e trabalhar durante o cumprimento da pena no regime fechado traz inúmeras vantagens. "Estamos cumprindo pena, sabemos da nossa situação, sabemos o que estamos fazendo aqui, mas o tempo não pode ser perdido de uma forma. Estou conseguindo me manter bem para sair melhor", refletiu Douglas, que está preso desde 2007 e deve ir para o aberto em 2015.

Ele disse também que o estudo ajuda a amenizar os efeitos negativos do regime fechado. "A gente sempre teve o intuito de trabalhar e fazer coisas para se ocupar. O cárcere é muito negativo porque você atrofia em vários sentidos, e o que acontece com a gente aqui [alunos] é que não sentimos os efeitos do cárcere nesse sentido. Físico sim, mas o mental não, a gente está muito bem por conta das oportunidades de estudo que tivemos", explicou ao G1.

Incentivo

Izelson está preso desde 2011 e começou o curso de técnico há seis meses. Antes de entrar para o regime fechado, tinha feito curso de inglês e telemarketing e queria voltar a estudar no presídio.

"A educação é a única coisa que resta para quem esquece o que aprendeu lá fora. Isso ajuda muito a todos nós. Estudei um pouco de psicologia aqui dentro e aprendi que existem duas classes de pessoas aqui: os perversos de caráter e os errantes de conduta. Esses errantes de conduta estão se reconciliando com o aprendizado", explicou Izaelson.

R.R. atuava na área de produção de vídeo antes de ser preso, em 2009. "Acho que se a educação tivesse mais presente dentro dos presídios ajudaria muito mais na ressocialização do preso", afirmou com base em experiência própria. Segundo ele, a oportunidade de estudar é como um incentivo para quem está "no caminho certo".

"A maioria do pessoal que faz cursos tem o pensamento de que mais tarde, quando chegar no alojamento [cela], não vai assistir programa sensacionalista. Vamos procurar informação.  A gente prega esse tipo de coisa com as pessoas que estão próximas da gente, porque já somos limitado aqui dentro, então temos que aproveitar as situações de informações", explicou, referindo-se ao tempo que os presos têm para assistir televisão.

Regressão de pena.

Segundo o diretor-adjunto do IPCG, Aud de Oliveira Chaves, além dos benefícios coletivos do estudo e trabalho entre os presos, como disciplina, ressocialização e bom comportamento, essas atividades também podem representar regressão da pena.

Nenhum comentário:

Postar um comentário