terça-feira, 19 de novembro de 2019

Acidente de trajeto: não precisa mais de CAT e não gera mais estabilidade


A Medida Provisória 905 publicada ontem, dia 12 de novembro, revogou a parte do art. 21 da Lei 8.213/91 que equiparAcidente de trajeto: não precisa mais de CAT e não gera mais estabilidadeava acidente de trajeto ou de percurso ao acidente de trabalho. Quais as repercussões disso? São várias. Por exemplo:

Se acidente de trajeto não é mais considerado acidente de trabalho, consequentemente já não há mais a necessidade de se emitir a CAT (a Comunicação de Acidente de Trabalho) nos casos de acidente de percurso.

Alguns estudiosos entendiam, inclusive, que desde a reforma trabalhista de 2017 a abertura da CAT para acidentes de trajeto já não era necessária. No meu entendimento, no entanto, somente agora, com a alteração trazida por essa MP 905 é que isso de fato se concretiza.

Outra repercussão: se acidente de trajeto não é mais considerado acidente de trabalho, caso necessite, o benefício previdenciário que o trabalhador que sofre acidente de percurso irá receber não será mais o auxílio-doença acidentário (cujo código é B91) mas sim o auxílio-doença previdenciário (de código B31). Quais as implicações disso?

Primeira: por ser auxílio-doença previdenciário, diferente do que ocorria, a empresa não precisará continuar pagando o FGTS enquanto vigorar o benefício.

Segunda implicação: sem o auxílio-doença acidentário, não há que se falar mais em estabilidade de até 1 ano após o acidente, ou seja, como acidente de trajeto não é mais considerado acidente de trabalho, os acidentes de percurso não geram mais estabilidade no emprego, independente da gravidade desse acidente.

E quanto ao cálculo do FAP, o que mudou? Nada, já que desde 2017 o acidente de trajeto não entra no cálculo do FAP.

E quanto a isenção de carência para os benefícios previdenciários nos casos de acidente de trajeto? Isso também continua valendo já que a isenção de carência repercute sobre acidentes de qualquer natureza, sejam eles de trajeto ou não.

Outra questão interessante: já que acidente de percurso não é mais acidente de trabalho, o empregador ainda pode ser condenado judicialmente a pagar alguma indenização ao empregado em virtude de algum acidente de trajeto? Sim, isso é possível. Isso porque uma coisa é não mais classificar acidente de trajeto como acidente de trabalho. Outra coisa é a responsabilização jurídica por qualquer acidente, seja de trajeto ou não.

Nesse aspecto, a jurisprudência trabalhista majoritária ainda entende, como regra geral, que as empresas não tem responsabilidade sobre os acidentes de trajeto, exceto quando o transporte é fornecido pelo próprio empregador. Nesses casos, as indenizações podem continuar ocorrendo.

Vamos aos exemplos práticos:

– Acidente de trajeto ocorrido até 11 de novembro de 2019:

Na minha opinião: Empresa deveria abrir a CAT;

O benefício previdenciário, caso necessário, estaria isento de carência e deveria ser o auxílio-doença acidentário (código B91);

Após terminar o benefício, inicia-se o período de estabilidade de pelo menos 1 ano;

E colocando uma “cerejinha” no nosso debate, em homenagem a MP 904, também de 12 de novembro, a vítima do acidente de trajeto poderia pleitear o DPVAT desde que estivesse enquadrada nos critérios de pagamento desse seguro. Isso porque, a extinção do DPVAT é apenas para aqueles que se acidentarem a partir do dia 01 de janeiro de 2020.

Outro exemplo:

– Acidente de trajeto hoje, 13 de novembro de 2019:

Empresa não precisa mais abrir a CAT;

O benefício previdenciário, caso necessário, é isento de carência e será o auxílio-doença previdenciário (código B31);

Após terminar o benefício não há estabilidade para esse trabalhador;

E como o acidente ocorreu ainda em 2019, a vítima do acidente de trajeto poderia pleitear o DPVAT desde que estivesse enquadrada nos critérios de pagamento do seguro.

Último exemplo:

– Acidente de trajeto no primeiro dia do ano novo, dia 01 de janeiro de 2020:

Empresa não precisa mais abrir a CAT;

O benefício previdenciário, caso necessário, estará isento de carência e será o auxílio-doença previdenciário (código B31);

Após terminar o benefício não há estabilidade para esse trabalhador;

E como o acidente ocorreu já ocorreu em 2020, a vítima do acidente de trajeto não teria mais direito ao DPVAT.

Pra finalizar, lembro que todas as regras que falamos aqui se fundamentam nas MPs 904 e 905, ou seja, são regras que podem ser revogadas pelo próprio congresso nacional em um período máximo de 120 dias [fora o tempo do recesso legislativo], prazo que acredito deva ser usado pelo congresso para tramitação dessas MPS. Somando os 40 dias de recesso parlamentar que teremos entre dezembro e janeiro, eu arriscaria dizer que, pelo menos até o início de maio, essas regras provavelmente se manterão vigentes. Essa é a minha opinião.

Autor: Marcos Henrique Mendanha (Instagram: @professormendanha // Site: professormendanha.com.br): Médico do Trabalho, Especialista em Medicina Legal e Perícias Médicas. Advogado especialista em Direito e Processo do Trabalho. Autor dos livros “Medicina do Trabalho e Perícias Médicas – Aspectos Práticos e Polêmicos” e “Desvendando o Burn-Out” (ambos da Editora LTr) e “Limbo Previdenciário Trabalhista” (Editora JH Mizuno). Diretor e Professor da Faculdade CENBRAP. Coordenador do Congresso Brasileiro de Medicina do Trabalho e Perícias Médicas e do Congresso Brasileiro de Psiquiatria Ocupacional. Diretor Técnico da ASMETRO – Assessoria em Segurança e Medicina do Trabalho Ltda. Colunista da Revista PROTEÇÃO.

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