quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Seminário do TST – Prevenção, fiscalização e ações regressivas foram destaque



Carta de Brasília, documento aprovado ao final do Seminário, sugere um pacto entre empregadores e empregados para prevenir acidentes de trabalho e lembra que a fiscalização é um dever do Estado.

Carta de Brasília sobre prevenção de acidentes de trabalho. 
Os participantes do Seminário de Prevenção de Acidentes de Trabalho, organizado e promovido pelo Tribunal Superior do Trabalho, no período de 20 a 21 de outubro de 2011, vêm a público para: 

1. 
expressar perplexidade e preocupação com o número acentuado e crescente de acidentes e doenças relacionados ao trabalho no País, que atinge diretamente a dignidade da pessoa humana, um dos fundamentos da República; 

2. 
alertar as empresas de que acidentes de trabalho são previsíveis e, por isso, evitáveis, razão pela qual prevenção e gestão de ri scos constituem investimento, enquanto reparação de danos implica prejuízo; 

3. 
recordar que é dever do empregador cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho (CLT, art. 157), obrigação do empregado colaborar no seu cumprimento (CLT, art. 158), e atribuição do Estado promover a respectiva fiscalização (CLT, art. 156), de modo a construir-se uma cultura de prevenção de acidentes; 

4. 
afirmar que um ambiente de trabalho seguro e saudável deve ter primazia sobre o recebimento de adicionais compensatórios pelas condições desfavoráveis;

5. 
registrar que o avanço do Direito Ambiental deve alcançar os locais de trabalho, para assegurar aos trabalhadores um meio ambiente seguro, saudável e ecologicamente equilibrado; 

6. 
exigir o fiel cumprimento do art. 14 da Convenção 155 da OIT, em vigor no Brasil desde 1993, segundo o qual questões de segurança, higiene e meio ambiente do trabalho devem ser inseridas em todos os níveis de ensino e de treinamento, incluídos aqueles do ensino superior técnico e profissional, com o objetivo de satisfazer as necessidades de treinamento de todos os trabalhadores; 

7. 
conclamar pela ratificação urgente da Convenção 187 da Organização Internacional do Trabalho – OIT, sobre o Marco Promocional da Segurança e Saúde no Trabalho; 

8. 
encarecer aos poderes constituídos a implementação, com urgência, de política nacional sobre segurança, saúde e meio ambiente do trabalho; 

9. 
proclamar a necessidade de maiores investimentos na produção e difusão de conhecimento sobre Segurança e Saúde no Trabalho e Meio Ambiente, bem como de uniformidade e maior presteza na divulgação das estatísticas oficiais relativas aos acidentes de trabalho no País, a fim de auxiliar a implementação de políticas públicas realistas e eficazes; 

10. 
convocar toda a sociedade para uma mobilização e conjugação de esforços na busca de medidas concretas para reduzir ao mínimo possível os acidentes e doenças relacionados ao trabalho, com os quais todos perdem. 

Brasília, 21 de outubro de 2011.

O segundo dia (21 de outubro) do Seminário de Prevenção de Acidentes de Trabalho, realizado pelo Tribunal Superior do Trabalho - TST, contou com a exposição de mais especialistas em segurança e saúde do trabalho e fechou as discussões com a aprovação da Carta de Brasília, que entre vários itens, lembrou que a fiscalização é um dever do Estado e que é necessário implantar uma polícia nacional de prevenção. Esta política, segundo o Ministério do Trabalho e Emprego, está praticamente pronta, faltando o aval da presidente Dilma Rousseff para se tornar realidade.

Para o Auditor-Fiscal do Trabalho Francisco Luís Lima, vice-presidente de Medicina do Trabalho do Sinait, que participou do evento, o Seminário foi uma oportunidade para se discutir as situações que resultam em acidentes de trabalho. “Ao final do evento foi redigida a Carta de Brasília, em que estão os pontos propostos para se buscar mais segurança nos ambientes de trabalho”, informou. Também participaram do Seminário os Auditores-Fiscais Franklim Rabelo e Marco Aurélio Gonsalves, vice-presidentes do Sindicato.

O painel “Prevenção efetiva do acidente de trabalho” apresentado pelo professor e pesquisador da Fundacentro - Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho, Gilmar Trivelatto. Ele explicou que a gestão de risco é um processo contínuo, e, apesar do conceito de risco zero ser impossível, o índice pode alcançar um nível satisfatório. Ele acrescentou que há ferramentas e metodologias que estimam a importância do risco para saber se é aceitável ou se exige algum tipo de intervenção. Por fim, sugeriu a revisão da legislação, o desenvolvimento de diretrizes setoriais, o apoio às pequenas empresas e o processo de certificação dos sistemas voluntários de gestão de risco (externo e independente).

A abordagem do Ministério Público do Trabalho.

O segundo palestrante do painel,  o procurador do trabalho Manoel Jorge e Silva Neto abordou o tema “Tutelas judiciais de prevenção” e ressaltou que a prevenção do meio ambiente do trabalho deve ser tratada como uma questão relacionada àtransgressão de direitos humanos no campo das relações de trabalho.

Manoel Jorge também esclareceu que, com a ação inibitória, as empresas podem ser obrigadas a fazer ou não alguma coisa. E criticou o fato de os efeitos da decisão numa ação civil pública estarem limitados à jurisdição do órgão que proferiu a decisão. Para o procurador é o mesmo que afirmar que um casamento só vale na comarca em que foi celebrado.

Grupos com maior impacto de acidentes de trabalho.

A mestra em saúde pública pela Universidade de São Paulo (USP) e pesquisadora da Fundacentro, a médica Maria Maeno afirmou em sua exposição que os grupos mais vulneráveis aos acidentes de trabalho – e que sofre grande impacto social – são as crianças, os adolescentes e os empregados terceirizados.

Dados subnotificados do Ministério da Saúde relativos a acidentes de trabalho com menores de 18 anos registram, somente em SP, 3.660 casos, e, no Brasil, 5.353, ou seja, dois acidentes por dia. “É importante chamar atenção para isso, por causa das repercussões dos acidentes no crescimento e no desenvolvimento desses menores”, afirmou.

Quanto à terceirização, chamou-lhe a atenção um dado do Ministério do Trabalho em 2005: oito em cada dez acidentes de trabalho eram registrados em empresas terceirizadas, e quatro em cada cinco mortes ocorriam com empregados de empresas prestadoras de serviço. Dados do Dieese mostram que os riscos de um empregado terceirizado morrer de acidente de trabalho é 5,5 vezes maior que nos demais segmentos produtivos.

Legislação sobre acidentes.

O juiz do trabalho Sebastião Geraldo de Oliveira, do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG), especialista em direito de empresa e do trabalho, afirmou que a legislação brasileira sobre o tema “está parada”, e que não basta aprovar leis sem a criação de uma política pública permanente voltada para a promoção da saúde e da segurança no trabalho. Ele destacou a importância da reunião de esforços para subsidiar essa política, uma das propostas do Seminário.“Embora existam muitos órgãos, siglas e programas, os acidentes continuam a acontecer”, afirmou. “Prevenção e promoção” são as palavras-chave, segundo o magistrado, para se co mpreender o estágio atual no Brasil em relação à saúde do trabalhador.

“Há documentos e recomendações sobrando para se tomar uma atitude, transformar isso em ação”, afirmou, lembrando que a Convenção 155 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) foi ratificada pelo Brasil em 1993 e, até hoje, as medidas que ela preconiza não foram colocadas em prática.

Por fim, lembrou que a Constituição de 1988 faz menção à saúde do trabalhador, mas o inciso que trata disso “passa desapercebido”. Para Sebastião, o ponto de partida e chegada de qualquer política de prevenção é reduzir os riscos.

Ações regressivas do INSS.

O presidente do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Mauro Luciano Hauschild, afirmou durante a sua exposição no Seminário, que as ações regressivas – que buscam das empresas o ressarcimento aos cofres da previdência do dinheiro gasto com o pagamento de pensões, auxílio acidente e aposentadorias a trabalhadores acidentados – servirão de base de sustentação jurídica para outras ações, também regressivas, relativas a acidentes de trânsito, a fim de que o dinheiro gasto pela Previdência com as vítimas seja ressarcido pelos condutores. “Ser responsabilizadas a indenizar não a Previdência em especial, mas os milhões de trabalhadores que contribuem para o fundo, pois quem paga os benefícios das vítimas de acide ntes são todos os trabalhadores, com a sua contribuição”, lembrou.

Mauro Hauschild afirmou que diversas soluções com o intuito de minimizar os problemas causados pelos acidentes de trabalho estão em estudo no Governo. Entre elas está a criação de uma política de incentivos fiscais para empresas que adotarem políticas de responsabilidade sócio-trabalhistas, e também a criação de um fundo nacional de reabilitação profissional, com a finalidade de criar condições para a reinserção do trabalhador acidentado no mercado de trabalho.

Pacto para cumprimento de normas de segurança.

De acordo com o médico sanitarista e do trabalho Zuhrer Handar, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), um dos palestrantes do Seminário, a melhor maneira de se prevenir os acidentes de trabalho é um pacto entre trabalhadores e empregadores pelo cumprimento das normas internacionais de segurança de trabalho previstas na OIT. Ao lado disso, outro fator fundamental seria uma ação política eficaz de segurança de saúde e prevenção por parte do Governo Federal - uma “verdadeira política de integração” entre o Congresso Nacional e os Ministérios do Trabalho e Emprego e da Previdência Social – para que fosse estabelecida uma “cultura de prevenção”, com planos, metas e diretrizes para a proteção do trabalhador.

Obras de Jirau.

O representante da Ordem dos Advogados do Brasil, José Guilherme Zagallo, afirmou, durante sua exposição no encontro, que as condições de trabalho nas obras das usinas hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio, em Porto Velho (RO), são“precárias e primitivas”. Zagallo visitou o local logo após as diversas manifestações de revolta dos trabalhadores, em abril deste ano. Segundo ele, naquela ocasião os operários tinham jornada de 60 horas semanais com a concordância dos sindicatos. A situação, segundo ele, era “um caldeirão perfeito para a ocorrência de acidentes”.

Zagallo observou que a realidade brasileira a respeito dos acidentes laborais, embora seja ainda alarmante, está melhor do que em décadas anteriores, mas, em números absolutos, o Brasil ocupa a terceira posição no mundo, com 723 mil acidentes de trabalho registrados em 2009, segundo os últimos dados disponíveis. Há registro de 421 mil acidentes típicos, 89 mil acidentes de trajeto, 17,6 mil doenças originárias do trabalho e 195 mil acidentes sem CAT (Comunicação de Acidente de Trabalho ao INSS).

O Brasil é também o terceiro país do mundo em número de mortes. Em 2009, 2.496 trabalhadores morreram em decorrência da atividade ocupacional, e 13.047 ficaram incapacitados permanentemente. São 2.139 acidentes para cada 100 mil trabalhadores. “Isso nos coloca na 17ª posição no mundo, em termos proporcionais e a quinta dentre os países do G20”.

Reforço na Fiscalização.

Para reverter essa situação, Guilherme Zagalo acredita que seria necessária a criação de um sistema de prevenção. Ainda na sua opinião, seria necessário também reforçar a fiscalização e, quem sabe, até mesmo fazer uma revisão das multas no sentido de torná-las expressivas para surtir efeito, “dolorosas para o mau empregador”.

“Há documentos e recomendações sobrando para se tomar uma atitude, transformar isso em ação”
Sebastião Geraldo de Oliveira, Juiz do Trabalho


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