Reprodução Rede Globo
Fonte: Agência Brasil
Rio de
Janeiro/RJ - O Ministério Público do Trabalho (MPT)
planeja instaurar procedimento investigatório para apurar o caso do
cinegrafista da TV Bandeirantes Santiago Ilídio Andrade, de 49 anos.
Atingido por um rojão durante uma manifestação popular contra o aumento das
passagens de ônibus, na última quinta-feira (6), no Rio de Janeiro, o
profissional teve morte cerebral diagnosticada na segunda-feira (10). Se
instaurado, o procedimento pode levar à adoção de medidas para garantir a
segurança dos jornalistas.
O procurador do Trabalho João Batista Berthier, coordenador do MPT no Rio de
Janeiro, disse que ele mesmo vai apresentar a notícia de fato (investigação
preliminar), que será distribuída, por sorteio, a outro procurador, que vai
decidir se o Ministério Público do Trabalho deve investigar o caso e tomar as
providências que julgar necessárias.
Se a investigação for instaurada, o procurador dá como certo que a TV
Bandeirantes seja ouvida sobre os procedimentos adotados para minimizar a
exposição de seus profissionais aos riscos da cobertura de protestos e
conflitos.
"Acho que não é um caso que deva ser arquivado, embora ainda seja cedo
para falarmos em um processo. Na medida em que uma atividade envolve risco,
ela implica, em tese, o uso obrigatório de equipamentos de proteção
individual como coletes e capacetes. O que é preciso agora é avaliarmos o que
aconteceu, que providências haviam sido tomadas [para evitar acidentes]. Às
vezes, o repórter dispõe de um capacete, mas não o usa. Ou não recebe um.
Temos que ver", disse o procurador, com exclusividade, à Agência Brasil.
Berthier confirmou não haver nenhuma norma do Ministério do Trabalho e
Emprego que trate da obrigatoriedade do fornecimento de equipamentos de
proteção individual aos trabalhadores da imprensa, mas lembrou que o Artigo
7º da Constituição Federal estabelece o direito de todos os trabalhadores à
redução dos riscos de acidentes do trabalho por meio do estabelecimento de
normas de saúde, higiene e segurança.
"No jornalismo, a questão é como o Estado deve proteger os trabalhadores
sem inibir a liberdade de imprensa. O jornalismo é uma atividade que, em
muitas situações, implica algum risco aos profissionais, e não dá
simplesmente para impedir os jornalistas de acompanhar ações e fatos em que
haja esse risco. Só que o Estado tem o dever de tutelar o trabalhador, e é
fundamental reduzir os riscos da profissão", disse o procurador.
"Essa é uma questão que deve ser discutida. As manifestações têm
terminado de forma violenta e, por isso, acho que é hora de todos tomarem
adotarem medidas preventivas. Acho que é preciso apostar no uso de
equipamentos de proteção individual ao menor sinal de perigo, como, por
exemplo, o arremesso de pedras", acrescentou o procurador.
Coordenador de comunicação da organização não governamental (ONG) Conectas e
responsável pelo curso sobre jornalismo em situações de conflito armado que o
Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) e a empresa de comunicação Oboré
promovem desde 2001, João Paulo Charleaux destacou que a prática do jornalismo
em situações como as manifestações registradas desde junho de 2013, em todo o
país, envolve riscos que devem ser minimizados com o uso de equipamentos de
proteção.
"Do ponto de vista jurídico, eu não conceituaria nenhuma dessas
situações como um conflito armado, mas sim como situações de violência
interna, de distúrbio e tensão. São situações em que temos visto vítimas -
entre elas, jornalistas. Portanto, é preciso que esses profissionais, as
redações e as empresas saibam que tais situações envolvem risco de morte, à
integridade física, emocional e psicológico", destacou o jornalista,
para quem a responsabilidade de uma empresa jornalística não é diferente da
de uma do setor da construção civil.
"Os profissionais que trabalham em situações que envolvem risco devem
ter equipamento de proteção individual e treinamento sobre o manejo do
equipamento, sobre os riscos e sobre o que fazer quando o pior acontece. No
Brasil, ainda não há essa cultura de preparar os profissionais para cobrir
situações de violência e muito menos para a compra e uso de material de
proteção individual", acrescentou Charleaux, lembrando que só
recentemente os profissionais que cobrem ações policiais em comunidades do
Rio de Janeiro começaram a usar capacetes coletes à prova de balas.
"Contraditoriamente, isso não é uma conquista, e sim um retrocesso do
ponto de vista da segurança pública, pois significa que a situação está mais
violenta. Ainda assim, é um avanço que os profissionais da comunicação
estejam mais alertas e se protejam. Ainda assim, é assustadora a recorrência
de situações em que profissionais de comunicação feridos [enquanto
trabalhavam] não usavam equipamentos", concluiu Charleaux.
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