Os 94 deputados da Assembleia Legislativa de São
Paulo aprovaram na noite desta terça-feira, por unanimidade, o projeto de lei
1.034, que obriga o fechamento das empresas envolvidas direta ou indiretamente
na exploração de trabalhadores em condições análogas à escravidão.
Agora, o texto precisa ser sancionado pelo
governador Geraldo Alckmin para entrar em vigor a partir de 2013.
Conforme a Folha antecipou em reportagem
publicada em 9 de novembro, o projeto vai cassar a inscrição estadual no
cadastro do ICMS das empresas que empregarem em suas cadeias produtivas mão de
obra nessas condições.
Trabalho análogo ao de escravo é aquele em que a pessoa
é submetida a condições degradantes, como correr riscos no ambiente de trabalho
(locais sem higiene, fiação exposta com risco de incêndio), jornadas exaustivas
(acima de 12 horas, como prevê a lei), servidão por dívida (tem a liberdade
cerceada por dívida com o empregador) e outras.
Segundo o deputado Carlos Bezerra Jr. (PSDB), autor
do projeto, as empresas que submeterem os trabalhadores a essas condições serão
impedidas de atuar no mesmo ramo de atividade, mesmo que seja em um
estabelecimento distinto.
"Serão proibidos de entrar com novo pedido de
inscrição no cadastro de contribuintes do ICMS. As restrições previstas devem
valer por um período de dez anos contados da cassação", disse.
"Sem causar prejuízo financeiro a quem lucra
com trabalho escravo e se esconde atrás de fornecedores em pseudo
terceirizações, o combate não é totalmente eficiente."
O projeto de lei 1.034 propõe que a empresa, o
fornecedor ou qualquer estabelecimento envolvido na cadeia produtiva seja
punido assim como seus sócios pessoas físicas ou jurídicas, em conjunto ou
separadamente.
"Essa aprovação é um marco, uma contribuição
pioneira para fazer de São Paulo um Estado onde a busca pelo lucro jamais
estará acima dos direitos humanos."
"O texto do projeto foi discutido com o
secretário Andrea Calabi, da Fazenda. Estou otimista e confiante quanto à sua
transformação em lei o quanto antes."
"O objetivo de quem se utiliza do trabalho
escravo não é outro senão o do lucro a qualquer custo. Então, para enfrentar
esse crime é preciso gerar prejuízo a quem o pratica. Com violação de direitos
humanos não há como contemporizar: o projeto é rigoroso, propõe mudança de
cultura. Sua aprovação é um avanço inédito."
SETORES
Os setores mais atingidos com ocorrências de
trabalho degradante são o têxtil e a construção civil. Estima-se que, por dia,
de 30 a 40 bolivianos chegam ao centro da cidade para trabalhar em confecções,
segundo entidades envolvidas no combate.
Em São Paulo, ao menos dez redes de varejo usaram
mão de obra de bolivianos irregulares no país e em condições degradantes de
trabalho, de forma indireta (com sistema de terceirização da cadeia produtiva
de costura), receberam autos de infração ou estão sendo investigadas.
As redes informam que não têm conhecimento do
problema e que as intermediárias são responsáveis pela contratação de oficinas.
De janeiro a 22 de outubro deste ano, foram feitas
91 operações de fiscalização no Brasil com o resgate de 1.054 trabalhadores.
Desde 1995, são 43 mil trabalhadores libertados dessa situação, segundo dados
da ONG Repórter Brasil.
Durante audiência pública realizada em novembro na
Assembleia Legislativa de São Paulo para debater o tema, a relatora da ONU
(Organização das Nações Unidas) para Formas de Escravidão Contemporânea, a
advogada armênia Gulnara Shahinian, afirmou que o Brasil precisa adotar medidas
que assegurem direitos de trabalhadores que migram ao país e de suas famílias
para fortalecer o combate ao trabalho análogo à escravidão.
"O país pode ter uma legislação eficiente para
combater o trabalho escravo e o tráfico de pessoas. Mas essa informação não
chega aos imigrantes. Até por barreira da língua, eles desconhecem seus
direitos. É preciso fazer que as leis sejam conhecidas para dar mais proteção
aos trabalhadores imigrantes e às suas famílias. Eles ainda estão muito
isolados", afirmou na ocasião.
Por: CLAUDIA ROLLI
A Folha de São Paulo
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