terça-feira, 9 de outubro de 2012

Trabalho artístico infantil

TST se prepara para julgar processo de trabalho infantil artístico no SBT.

O trabalho infantil, mais do que nunca, tem sido alvo constante de debates e discussões, não apenas porque a sociedade, em geral, o desaprova, mas também e principalmente por ser cruel com as crianças, privando-as de uma infância saudável e de um futuro melhor.


Com o trabalho artístico infantil é diferente. A sociedade o enxerga de maneira glamourizada, os pais das crianças o aprovam e por fim, a própria legislação, como a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que no artigo 406 permite a juízes das Varas de Infância e Juventude autorizarem ao menor o trabalho em empresas circenses - como acrobata, saltimbanco e ginasta, dentre outros -, desde que a apresentação tenha fim educativo ou a peça de que participe não prejudique sua formação moral.


A matéria especial desta semana é sobre o trabalho artístico infantil, legislação, possibilidade de regulamentação e competência para autorização do trabalho precoce - reivindicada pela Justiça do Trabalho. Os ministros do TST se preparam para julgar um processo que pede a proibição do trabalho artístico de menores de 14 anos em uma das maiores emissoras de televisão do país,o SBT. A ação é do Ministério Público do Trabalho.


Engano

O trabalho de crianças artistas sempre encantou os adultos, não apenas no Brasil, mas em todo o mundo. Um exemplo clássico são os atores mirins de Hollywood e por aqui, quem não se lembra das crianças que atuaram no Sítio do Pica-pau Amarelo?


O fato é que os pais dessas crianças artistas ficam felizes em vê-las atuando na televisão, tanto que avisam aos amigos que seu filho vai aparecer na telinha.


"A sociedade enxerga o trabalho artístico infantil como algo absolutamente normal, associado aos padrões de sucesso e fama", alerta o procurador do Trabalho Rafael Marques, coordenador nacional de combate ao trabalho infantil, pelo Ministério Público do Trabalho.


Até mesmo os pequenos artistas circenses que se apresentam nos sinais de trânsito das grandes capitais brasileiras carregam o estigma que engrandece o trabalho artístico infantil. E não comovem nem mesmo as autoridades, que permitem a continuidade das apresentações. "Acabam se acomodando frente a essa grave situação de lesão de direitos ao reproduzirem o mito, a falsa ideia, de que é melhor aquela criança estar ali fazendo malabares, do que roubando, assaltando ou se prostituindo", esclarece.

Pesquisa feita com o elenco infantil de uma novela evidenciou flagrante desrespeito à legislação por diversos fatores, como a falta de alvarás judiciais permitindo a atuação dos menores, e a proibição da permanência dos acompanhantes dos artistas mirins durante a realização de testes, gravações e apresentações. "Inexistem cuidados especiais para adaptar o processo produtivo às necessidades do artista mirim, e as relações são estabelecidas em ambiente de pressão, competição e vaidade", alertou a pesquisadora da USP, Sandra Regina Cavalcante (foto).



A psicóloga Mônica Soares Cazzola define como delicada a situação do trabalho artístico infanto-juvenil, pelo fato de a Justiça e a sociedade em geral só reprovarem o trabalho de menores em carvoarias, na agricultura e em ambientes domésticos. "O glamour da carreira artística atinge todas as classes sociais, de forma que há crianças atuando em novelas, teatros e desfiles de moda e na publicidade", afirmou no artigo "Trabalho infantil artístico: competência da Justiça Estadual ou da Trabalhista?" publicado na Revista nº 50 do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ).


Justiça

O tema trabalho artístico infantil é complexo e polêmico. O Tribunal Superior do Trabalho irá analisar agravo de instrumento proveniente de ação civil pública interposta pelo Ministério Público do Trabalho de São Paulo, contra o SBT (Sistema Brasileiro de Televisão), no sentido de obrigar a emissora a se abster de admitir, em qualquer espécie de trabalho, menores de 16 anos - salvo na condição de aprendiz e a partir dos 14 anos, conforme previsto no artigo 7º, inciso XXXIII, da Constituição Federal. A instituição busca ainda a condenação do SBT por dano moral coletivo no valor de R$ 1 milhão. Mas a Justiça do Trabalho em São Paulo já negou os pedidos na primeira e segunda instâncias.


Na ação, o MPT pede que menores sejam proibidos de atuarem em programas artísticos transmitidos pela emissora, "sendo expostos a situações vexaminosas, humilhantes ou psicologicamente perturbadoras", como ocorrido com a pequena apresentadora.



Susto

Segundo o MPT, a emissora tinha alvará judicial autorizando a participação da menina apenas no Programa "Bom Dia & Cia", destinado ao público infantil. Mas ela teria passado a se apresentar também do programa "Sílvio Santos – Domingo Animado", destinado ao público adulto, para o qual não havia autorização judicial.


Em uma dessas apresentações no Domingo Animado, ao se deparar com outra criança fantasiada de monstro, a pequena Maísa correu pelo estúdio chorando e gritando desesperadamente, culminando por bater a cabeça em uma das câmeras instaladas no palco.


Diante da gravidade dessas ocorrências, o MPT entendeu pela sua imediata atuação. "A criança e o adolescente, embora possuam talento e aptidão para as artes, não devem ser transformados em fonte de renda da família", devendo ser priorizados seus estudos, as brincadeiras e a realização de atividades compatíveis com seu estado de formação, afirmou o procurador do Trabalho, Orlando Schiavon Júnior, autor da ação.


Para Schiavon, a regra é a proibição total do trabalho a menores de 14 anos, inclusive para o infantil artístico, "pois não raro, importam quebra do princípio da proteção integral, podendo-se, de modo excepcional, ser autorizado, de forma individual e protegida". Todos os menores deverão ter autorização judicial para cada novo trabalho realizado, conforme prevê o artigo 114, inciso I, da Constituição Federal e o artigo 149, inciso II do Estatuto da Criança e do Adolescente, lembrou o MPT.


Decisão

Para o juiz titular da Vara do Trabalho de Osasco, Jean Marcel de Oliveira, não seria jurídico nem justo, que, por causa de uma violação praticada pela emissora e já reprimida, fosse ela impedida de contratar menores devidamente autorizados para participar de seus programas. "O que implicaria inclusive em ceifar a carreira de diversos menores que, por talento pessoal, estão tendo condições melhores de vida pessoal e financeira, para si e seus familiares", explicou.


Esse fato o levou a concluir pela não violação a direito difuso e coletivo ou individual e homogêneo, mas violação, ainda parcial, a direito individual da menor, já tutelado pela Vara da Infância e da Juventude de Osasco, inexistindo qualquer demonstração no processo de que o incidente ocorrido com a apresentadora tenha acontecido também com outros menores. O magistrado julgou improcedentes os pedidos do MPT.


Contra a sentença, o Ministério Público recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP), mas a decisão foi mantida, entre outras razões, por não existir lei que proíba o trabalho do menor, e ainda por não evidenciar violação a direitos difusos coletivos ou individuais homogêneos, decorrente de conduta da emissora. Para ter seu recurso processado no TST, o MPT interpôs agravo de instrumento, que aguarda julgamento.


Comissão Nacional

"O trabalho artístico infantil é uma questão bastante complicada culturalmente de se abordar", ressalta a juíza Andréa Saint Pastous Nocchi, membro da Comissão de Erradicação do Trabalho Infantil, instituída este ano pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho e o Tribunal Superior do Trabalho. Coordenada pelo ministro Lelio Bentes Corrêa, o objetivo da Comissão é desenvolver ações, projetos e medidas em prol da erradicação do trabalho infantil no Brasil e da proteção ao trabalho do adolescente.


Segundo Andréa Pastous a criança não pode ser usada, ainda que artisticamente, para representar o que ela não é. "Ter um comportamento de adulto, agir de forma diferente do que uma criança agiria naquela situação", destaca. E explica que os papéis delegados aos adolescentes e crianças devem ser compatíveis com a idade que eles têm, representando de forma o mais fiel possível, a idade e maturidade do ator.


Andréa destaca que uma das maiores dificuldades enfrentadas para coibir o trabalho infantil é justamente o apoio dos pais.

Relação jurídica não é de emprego

De acordo com o professor e juiz do Trabalho aposentado, Oris de Oliveira, "a relação jurídica de trabalho da criança ou do adolescente exercida em representações artísticas ou em espetáculos públicos não é de emprego". Entre outras razões, segundo, ele, porque o artigo 3º da CLT exclui a prestação de serviços eventuais do conceito de empregado.

"De modo geral não há regra específica sobre as relações laborais que venham a ser praticadas pelos pequenos artistas" ressalta a ministra do TST Kátia Arruda em entrevista exclusiva publicada aqui, no site do TST, amanhã.


(Lourdes Cortes / RA)



Leia também:

A difícil tarefa na regulamentação do trabalho infantil artístico


(Dom, 7 Out 2012, 07:00)

Será que existe interesse na regulamentação desse trabalho? A medida é defendida por educadores, psicólogos, assistentes sociais e diversos profissionais que conhecem, de perto, as condições a que são submetidas crianças e adolescentes que sonham em ingressar no mundo artístico. A angústia durante a seleção de candidatos, a frustração dos excluídos, a pressão durante as gravações e exibições ao vivo, as longas jornadas e os prejuízos na frequência e rendimento escolares são vivenciados diariamente por milhares de crianças e adolescentes brasileiros.


Para o juiz do Trabalho aposentado e professor de Direito Oris Oliveira impõe-se a regulamentação do trabalho artístico infantil. "A complexidade é tão grande e os problemas emergentes tão delicados que não se pode se contentar com remeter-se às normas celetistas ou às genéricas do ECA", fazendo necessária uma "regulamentação elaborada com visão multidisciplinar da matéria".


Mas ele ressalta que a normatização não exclui a responsabilidade da família no acompanhamento dos menores que se aventuram na área artística. "Não se deve deduzir ser dispensável a atuação do poder-dever familiar a tudo que diga respeito ao trabalho dos filhos. Os pais devem previamente se informar sobre onde os filhos vão trabalhar, em que condições, assisti-los na celebração do contrato, exigir sua extinção se prejudicial a qualquer título."


O desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro Siro Darlan defende a importância de conciliar o texto legal com a realidade cultural e social do país. "Criança tem o direito de estudar e brincar; adolescente de estudar e ser preparado para o exercício pleno da cidadania e isso inclui a educação para o trabalho, sob pena de ser alijado do mundo competitivo." Ele alerta para o fato de que privar crianças de direitos básicos, como educação e lazer, contribui para o aumento das diferenças de oportunidades profissionais entre os mais pobres e os mais ricos.


Congresso

Pelo menos uma proposta legislativa sobre o tema tramita no Congresso Nacional. O Projeto de Lei nº 83/2006, de autoria do senador Valdir Raupp, está na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal. O PL fixa a idade mínima de 14 anos para o trabalho como ator, modelo e similares, com autorização apenas da família ou do representante legal. Já os menores de 14 anos necessitariam de autorização judicial para o trabalho.


Mas a proposta ainda não é suficiente, na avaliação do procurador do Trabalho Rafael Marques. "É um PL tímido, que peca por não incluir aqueles parâmetros de proteção dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes", avalia.


A competência para expedir alvarás de trabalho infantil prevista no artigo 406 da CLT é alvo de outro projeto, desta vez da Câmara dos Deputados. Em maio último, o deputado Manoel Júnior (PMDB-PB) propôs o Projeto de Lei nº 3.974/2012, que pretende transferir à Justiça do Trabalho a competência para análise dos pedidos.


Para o deputado, em que pese a legislação vigente conferir esta competência ao juiz da Vara da Infância e da Juventude, a matéria é de cunho eminentemente trabalhista, o que atrai a competência da Justiça do Trabalho, especialmente após a ampliação ocorrida com a nova redação do artigo 114 da Constituição Federal, conferida pela Emenda Constitucional nº 45/2004.


A alteração é defendida também pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), e pelo Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPeti).


Na opinião do procurador Rafael Marques, o PL cumpre algo já posto desde a Emenda 45, a qual ampliou a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar todas as causas advindas da relação de trabalho. "Creio que as autorizações para o trabalho infantil se põem neste contexto", afirmou, considerando, ainda, ser um projeto muito bem vindo, por aclarar o alcance da referida Emenda Constitucional.


Ele entende que a Justiça do Trabalho está aparelhada para analisar os pedidos de autorização para o trabalho infantil artístico, pois já lida com questões envolvendo relações de trabalho e seus riscos para a saúde e segurança do trabalhador.


Oris de Oliveira também defende a competência da Justiça do Trabalho para análise dos pedidos. Apesar da longa tradição brasileira - consolidada no Código de Menores de 1927– de levar todas as questões referentes aos menores, ao Juizado da Infância e Juventude, para o professor e juiz do Trabalho aposentado, após a EC nº 45/2004 "havendo conflito de interesse em qualquer modalidade de trabalho nas representações artísticas de crianças e adolescentes, que exija intervenção da Justiça, a competência é do juiz trabalhista".


Trabalho Infantil

Embora o artigo 7º, XXXIII da Constituição Federal proíba o trabalho noturno, perigoso ou insalubre aos menores de 18 anos; e qualquer trabalho a menores de 16 - salvo como aprendiz, a partir de 14 anos -, em um passado não muito distante, a situação das crianças era bem pior.


Ocorreram grandes avanços na legislação brasileira. Para se ter ideia, no século XIX, uma criança com oito anos podia trabalhar em fábrica de tecidos, de acordo com o Decreto nº 1.313 de 1891 que, apesar de limitar a idade mínima em 12 anos, admitia o trabalho a partir de oito anos, na função de aprendiz, nas fábricas de tecidos.



Essa realidade começou a mudar somente em 1924, com a Declaração dos Direitos da Criança, pela Liga das Nações, considerada um avanço nos direitos infantis. Com a publicação em 1959 da Declaração dos Direitos Humanos pela Organização das Nações Unidas (ONU) esses direitos foram ampliados.


O artigo 9 da Declaração dispõe, dentre outros, que a criança deve ser protegida contra toda forma de abandono, crueldade e exploração e não será permitido seu trabalho antes de uma idade mínima adequada. "Em caso algum será permitido que a criança se dedique, ou a ela se imponha, qualquer ocupação ou emprego que possa prejudicar sua saúde ou sua educação, ou impedir seu desenvolvimento físico, mental ou moral."


O mesmo Organismo, 30 anos depois, em 1989, na Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança e do Adolescente (artigo 32), previu a obrigatoriedade de o Estado proteger a criança do trabalho que constitui uma ameaça à saúde, educação, e desenvolvimento. Estabeleceu idades mínimas para a admissão em emprego e regulamentou as condições permitidas para o trabalho do menor.


Flexibilização para trabalho artístico

No Brasil o trabalho infantil é proibido para menores de 14 anos, segundo o inciso I, § 3º do artigo 227 da Constituição Federal. Também a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) no artigo 403 o proíbe para menores de 16, salvo na condição de aprendiz, a partir dos 14.


Embora a proibição se estenda a todas as formas de trabalho, quanto ao artístico infantil, existe uma flexibilização, prevista no artigo 406 da CLT, segundo o qual, o juiz de Menores poderá autorizar o trabalho em empresas circenses - como acrobata, saltimbanco e ginasta – e na produção, composição, entrega ou venda de escritos, impressos, cartazes, desenhos, gravuras, pinturas, emblemas e quaisquer outras. Desde que a representação artística tenha fim educativo ou a peça de que participe não prejudique sua formação moral.


Lançando mão desse artigo alguns veículos de comunicação, especialmente a televisão e o cinema contratam crianças com idade inferior à prevista na legislação para trabalhar como atores. Também é possível vê-las atuando como modelos, contratadas pelas agências de moda e de publicidade.


O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90), no artigo 149, dispõe que compete à autoridade judiciária disciplinar, através de portaria, ou autorizar, mediante alvará, a participação de criança e adolescente em espetáculos públicos e concursos de beleza. Contudo, a autoridade deverá considerar as peculiaridades locais, a existência de instalações adequadas, a adequação do ambiente à eventual participação ou frequência de crianças e adolescentes, entre outras coisas.


Autorizações

O procurador do Trabalho Rafael Marques explica que a Convenção nº 138 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), sobre a idade mínima de admissão ao emprego, ratificada pelo Brasil, admite a possibilidade de trabalho artístico para menores de 16 anos, em situações excepcionais, individuais e específicas. Mas também especifica a necessidade de licença ou alvará individual, o qual deverá definir em que atividades poderá haver o trabalho e quais as condições especiais.


A psicóloga Mônica Soares Cazzola lembra que esse alvará individual "é utilizado geralmente nos casos do trabalho de ator e atriz nas novelas, ou de participações de menores na mídia televisiva em geral". No caso de atuação de crianças em matéria publicitária ou em figuração nos canais de televisão, "utiliza-se um mero termo de cessão de uso de imagem assinado pelos pais", afirmou.


O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) admite a participação de crianças e adolescentes em espetáculos públicos e seus ensaios, desde que a autoridade competente observe entre outros pontos, o tipo de frequência habitual ao local, o horário da atividade a ser realizada e a manutenção da frequência à escola.


Justiça e Ministério Público impõem restrições

Uma recomendação conjunta será editada pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e Conselho Nacional de Justiça (CNJ) estabelecendo os requisitos necessários à concessão de autorização excepcional para o trabalho infantil artístico, a menores de 16 anos, conforme prevê a Convenção 138 da OIT. Deverão ser observadas condições muito específicas que garantam a proteção dos direitos fundamentais das crianças e adolescentes.


A proposta é decorrente do I Seminário Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil realizado pelo CNMP, em Brasília, no dia 22 de agosto, em parceria com a Corregedoria Nacional de Justiça do CNJ e o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).


Cerca de 150 membros do Ministério Público de todos os ramos, juízes, defensores públicos e representantes do Ministério do Trabalho e Emprego, do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e da Secretaria de Direitos Humanos se dividiram em grupos para propor ações de combate ao trabalho infantil.


Propuseram também, a solicitação de manifestação técnica do Ministério do Trabalho e Emprego, quando a autoridade judiciária entender necessária, nos processos judiciais de autorização para trabalho infantil artístico, como elemento de convencimento do juiz, sobre a regularidade da situação. Manifestaram ainda que deve haver proibição de toda e qualquer forma de trabalho infantil artístico que conduza à erotização precoce; com conteúdo de pornografia infantil, considerando nas duas hipóteses, o prejuízo psicológico que a atividade proporciona. Estimularam o CNMP e o CNJ a tornarem permanente um foro interinstitucional de discussão sobre o tema do trabalho infantil.


TST e sociedade discutem medidas de proteção a crianças e adolescentes

Na próxima semana, a partir de terça-feira (9), o Tribunal Superior do Trabalho começa a discutir com a sociedade temas de séria relevância no combate ao trabalho infantil. E o trabalho artístico será amplamente analisado pelos ministros juntamente com especialistas.


O Seminário Trabalho Infantil, Aprendizagem e Justiça do Trabalho é a primeira ação da Comissão Nacional de Trabalho Infantil instituída este ano pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT) e Tribunal Superior do Trabalho.


No segundo dia do evento cinco especialistas participam do painel "Trabalho infantil esportivo e artístico: conveniência, legalidade e limites": a advogada Sandra Regina Cavalcante, Antônio Galvão Peres (advogado e Doutor em Direito do Trabalho pela USP), o professor Marcelo Pato Papaterra, Carlos Eduardo Ambiel (advogado e mestre em Direito do Trabalho), e o coordenador Nacional de Combate à Exploração do Trabalho de Crianças e Adolescentes do MPT, Rafael Dias Marques.


O seminário é o primeiro passo de um conjunto de ações que agora integram as prioridades do TST e CSJT, e ocupa o lugar de marco histórico pelas dimensões e importância dos temas que serão tratados em três dias de intenso debate.

Entrevista da ministra Kátia Arruda sobre Seminário Trabalho Infantil no TST




mais

Kátia Arruda diz que trabalho artístico infantil pode gerar danos irreparáveis

(Dom, 7 Out 2012, 10:00)

Autora de diversos trabalhos sobre Direitos Humanos e do Trabalho, a ministra do Tribunal Superior do Trabalho Kátia Magalhães Arruda fala sobre o trabalho artístico infantil. Influência de fatores econômicos e sociais, garantia dos direitos fundamentais, e consequências do trabalho precoce. "O estresse permanente que envolve a atividade artística pode causar prejuízos psicológicos irreversíveis!" (Kátia Arruda)



O fator econômico é condicionante do trabalho infantil. A senhora acha que ele influencia, também, o trabalho artístico infantil?

Kátia Arruda -O fator econômico é predominante, mas não é o único. Sem dúvida a má distribuição de renda e a pobreza enfrentada nas famílias faz crescer o número de crianças trabalhadoras no Brasil e em qualquer lugar do mundo. Existem, entretanto, outros fatores que também podem interferir, tais como: a falta de oportunidades na comunidade onde residem essas crianças, a ausência ou má qualidade da educação escolar e a falta de outros estímulos favoráveis ao desenvolvimento da infância. Quando se trata do trabalho artístico, o fato econômico nem sempre é o predominante.


A legislação garante os direitos de jovens e crianças que trabalham em atividades artísticas?

Kátia Arruda -Há uma proteção constante da Lei 6533 de 1978 referente aos filhos de artistas em "atividade itinerante", que terão assegurada a matrícula e vaga em escolas públicas de 1º e 2º graus, mas de modo geral não há regra específica sobre as relações laborais que venham a ser praticadas pelos pequenos artistas.


A convenção 138 da OIT, em seu artigo 8.1 prevê que a autoridade competente poderá conceder, por meio de permissões individuais, exceções à proibição de trabalhar, no caso de participação em representações artísticas. A questão referente às autorizações judiciais tem sido objeto de grande discussão no meio jurídico. O fato é que todas as regras de proteção constantes na Constituição Federal, no Estatuto da Criança e do Adolescente, na CLT e legislação afim, também devem ser aplicadas ao trabalho artístico de crianças.


A legislação estabelece a idade mínima de 16 anos para o trabalho de jovens. Por que há crianças com idade inferior na televisão, cinema e espetáculos diversos?

Kátia Arruda -A idade mínima para o trabalho de crianças e adolescentes é de 16 anos, salvo na condição de aprendiz (a partir dos 14 anos), conforme estabelece o art. 7º, XXXIII da Constituição Federal. A realidade é que existem crianças com idade bem inferior trabalhando em espetáculos, devido a uma visão "glamourizada" do trabalho artístico, o que nem sempre corresponde ao real. Pesquisas mostram que as crianças sofrem também no trabalho artístico, a exemplo de gravação de cenas sucessivamente repetidas até à exaustão, como ocorre na televisão.


Enquanto a sociedade rejeita a exploração do trabalho de crianças em carvoarias, minas e outras atividades insalubres ou perigosas, costuma haver uma condescendência quanto ao trabalho na televisão. Resta saber se, a despeito da tolerância social, não persistem danos à saúde física e/ou psíquica, inclusive coma exposição à mídia, interferências em sua vida privada e, muitas vezes, atrapalhando sua vida escolar.


Na opinião da senhora, o trabalho infanto-juvenil artístico deve ser regulamentado ou abolido?

Kátia Arruda -Todo trabalho noturno, perigoso ou insalubre é proibido para os que tem idade menor que dezoito anos, conforme diz textualmente o art. 7º, XXXIII da Constituição Federal, preceito que, aliás, está em consonância com a Convenção Internacional nº 138 da OIT (Organização Internacional do Trabalho). O artigo 405 da CLT, por sua vez, também proíbe o trabalho em locais ou serviços prejudiciais à saúde e à moralidade.


O trabalho dito "artístico" que esteja inserido em qualquer das hipóteses acima é ilegal e deve ser abolido. Algumas atividades que visam a preservação da cultura local, por exemplo, brincadeiras artísticas como o "bumba meu boi" no Norte e Nordeste, sem relação profissional ou fins lucrativos, não são, em geral, consideradas como trabalho.


Quando se trata de trabalho efetivo, em rádio, televisão, teatro ou outras atividades similares, desde que não haja prejuízo à saúde e a moralidade, deve seguir os limites constitucionais de idade mínima (dezesseis anos) e, ocorrendo a excepcional situação de trabalho com idade inferior, devem ser analisadas todas as circunstâncias específicas, para evitar a exploração e exposição das crianças, de modo que prevaleça sua proteção com prioridade absoluta.


Devo ressaltar que a possibilidade de permissão, mesmo que excepcional, do trabalho de crianças e adolescentes menores de 16 anos em atividades artísticas, não é unânime, embora prevista em Convenção Internacional, havendo ressalvas inclusive de minha parte.


Quais as consequências do trabalho precoce na vida de crianças e adolescentes?

Kátia Arruda -O estresse permanente que envolve a atividade artística, aliado às obrigações contratuais com horários, regras, além da possibilidade de exposição a diversos fatores de risco podem causar prejuízos psicológicos irreversíveis. Além disso, é comum o abandono ou descontinuidade escolar com defasagem na aprendizagem.


A criança trabalhadora sofre todo tipo de pressão, semelhante a um adulto, sem ter, no entanto, a maturidade e a experiência necessária, causando vários transtornos, ambiguidades, além de percepções destorcidas da realidade, motivos que entendo como suficientes para restringir esse tipo de atividade. "Criança da IBOPE". Já foi comprovado que a aparição de crianças em propagandas rende maior atenção ao produto que está sendo anunciado e em busca do lucro, muitas crianças são exploradas.


Por que as autorizações para o trabalho artístico infantil são expedidas pelas Varas da Infância e Juventude e não pela Justiça do Trabalho, como estabelece a EC 45? Como garantir , aos artistas mirins, o direito à proteção integral?

Kátia Arruda -Entendo que as autorizações de que trata o art. 8.1 da Convenção da OIT devem ser interpretadas com alguns parâmetros. A autoridade competente deve ser uma autoridade do judiciário trabalhista, em cumprimento ao art. 114, I da Constituição Federal de 1988; o trabalho deve limitar-se a atividades ou manifestações artísticas; devem ser estabelecidas as premissas de proteção física, psicológica e social, principalmente a garantia de não prejuízo à frequência escolar e ao desenvolvimento das atividades de lazer.


Penso que o juiz do trabalho, com a missão social que lhe é inerente e com todo o arcabouço de conhecimento que tem e com sua experiência profissional, é a melhor autoridade para analisar cada caso, com seus limites e repercussões. De qualquer modo, a proteção à criança deve ser prioritária, sob pena de retirar-lhe o tempo destinado ao lazer, à educação, ou simplesmente, ao desenvolvimento do "ser criança".


(Lourdes Cortes – Fotos: Aldo Dias)



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