quarta-feira, 18 de julho de 2012

Sistema de Ar-condicionado



Edifícios saudáveis
Para evitar a disseminação de doenças provocadas pelo ar contaminado, projeto deve seguir prescrições de normas técnicas e prever planos de manutenção periódica


Débora Prado
Fotos: Marcelo Scandaroli
A Síndrome do Edifício Doente ocorre em construções nas quais pelo menos 20% dos ocupantes apresentam sintomas de doenças relacionadas à má qualidade do ar interno, que pode ser potencializada pelos sistemas de ar-condicionado

Em um primeiro momento, problemas de saúde como dores de cabeça, fadiga e irritação nos olhos, nariz e garganta parecem não ter qualquer relação com os aspectos construtivos de uma edificação. Quando mais de 20% dos ocupantes apresentam esses sintomas, porém, o imóvel pode ser diagnosticado com a Síndrome do Edifício Doente (SED), reconhecido em 1982 pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Nesses casos, a origem do problema pode estar na concepção do projeto da edificação - principalmente dos sistemas de ar-condicionado - e na falta de planos de manutenção periódica dos equipamentos.


De acordo com o diretor-adjunto da MHA Engenharia, Aldo Bianco, o principal fator para detectar a SED é a condição interna de qualidade do ar. "A detecção se dá por análises físico-químicas do ar, quando os parâmetros de contaminação não são mantidos dentro dos valores recomendados e quando surgem esses sintomas entre os ocupantes", explica.


Com isso, prédios com sistemas de ventilação inadequados são fortes candidatos a apresentar a síndrome. Segundo o Instituto Nacional de Saúde e Segurança Ocupacional dos Estados Unidos (Niosh, na sigla em inglês), entre os diversos agentes causadores da SED, a ventilação inadequada é a responsável em mais de 50% dos casos.


"Essa síndrome aparece porque várias edificações começaram a ser construídas de forma hermética, sem ventilação natural, gerando a necessidade de climatização artificial. Então, se esse sistema de climatização não opera com eficiência ou fica obsoleto, aparecem problemas", explica Henrique Cury, presidente do Qualindoor, o departamento responsável pela qualidade do ar de interiores na Associação Brasileira de Refrigeração, Ar-condicionado, Ventilação e Aquecimento (Abrava). "Por isso é importante, ao fazer um projeto, priorizar a captação de ar externo ou utilizar tecnologias que substituam isso. E, no caso do uso de ar-condicionado, garantir uma boa manutenção", indica.
Erros de projeto mais comuns causadores da SED

Taxa de renovação de ar insuficiente ou inexistente

Tomada de ar de renovação posicionada em local inadequado

Filtragem de ar inadequada para a utilização dos ambientes atendidos

Salas de equipamentos inadequadamente dimensionadas, que não permitem manutenção e higienização

Falta de pontos de acesso para limpeza e higienização dos dutos

Falta de meios de balanceamento dos volumes de ar (registros, dumpers, etc.) ou falta de acesso a eles

Fotos: Marcelo Scandaroli
Locais de tomada de ar externo devem estar distantes de fontes poluidoras como depósitos de lixo e locais de passagem de veículos
Projeto

É possível garantir que a edificação apresente ar de boa qualidade, desde que alguns cuidados sejam observados na elaboração do projeto. Alguns fatores associados à qualidade do ar no interior dos edifícios são bem importantes para serem considerados, como a taxa de renovação de ar (também conhecida como taxa de ar externo), a filtragem de ar e as distâncias dos pontos de captação das tomadas de ar externo de possíveis fontes poluidoras.


Danilo Werneck, diretor técnico da DW Engenharia, ressalta que no desenvolvimento do projeto é muito importante o cálculo correto das taxas de renovação de ar, de forma que, para os ambientes ocupados, seja mantido um nível máximo de 1.000 ppm de CO2.


Para tal, a tomada de ar externo deve ser sempre localizada em pontos altos, longe de fontes de poluição, filtrados e, se possível, também desumidificados por um sistema de tratamento primário. "A classe de filtragem também é importante, de forma a garantir a qualidade interna do ar. Locais com possíveis pontos de formação de fungos e bactérias, como bandejas de condensados, devem ser tratados com uso de dreno que evitem algum condensado retido", indica.


A filtragem do ar é feita em duas etapas: na captação do ar externo, onde são retidas partículas de grande porte, e nos equipamentos de condicionamento de ar. Outro item de igual importância é o local onde é feita a captação do ar externo de renovação, que, por norma, deve estar a 5 m de distância de quaisquer fontes poluidoras, detalha Guilherme Rebello Lourenço, coordenador de eficiência energética da unidade de sustentabilidade do Centro de Tecnologia de Edificações (CTE).
Fotos: Marcelo Scandaroli
Responsáveis diretos pela qualidade do ar distribuído pelos sistemas de ar-condicionado, filtros exigem trocas frequentes. Em alguns casos, pode ser necessária a adoção de filtros de sacrifício
Esses fatores estão diretamente ligados aos principais erros de projeto que favorecem o surgimento da SED. As taxas de ar externo abaixo do valor mínimo exigido geram alta concentração de poluentes, gases e outras substâncias no ambiente, levando, consequentemente, a problemas como falta de concentração e fadiga no ambiente de trabalho. Tomadas de ar externo muito próximas às descargas de ar de exaustão, como sanitários, depósitos de lixo ou passagem de veículos, também contribuem com o acúmulo de poluentes.


Uma maneira de evitar problemas é prever no projeto a setorização do sistema de ar-condicionado, evitando a comunicação por dutos entre ambientes que possuam atividades muito distintas. "Com isso, é possível selecionar adequadamente o tamanho da serpentina de resfriamento, pois nela se acumula grande quantidade de água condensada, proliferando fungos e bactérias. Também deve-se definir as etapas e classificações de filtragem por tipo de ambiente, levando em consideração a situação de projeto e operação, isolando sempre que possível as tomadas de ar externo. Em certos casos, é aconselhável a utilização de um sistema de lâmpadas ultravioleta (UV) que higienizam a serpentina dos condicionadores de ar", complementa Lourenço.


Outro aspecto a ser considerado em projeto é a previsão de um espaço adequado para realização de limpeza e manutenção do sistema de ventilação. É importante, ainda, lembrar que o ar-condicionado não existe sozinho e deve ser compatibilizado com outros projetos de instalações. "Existem instalações hidráulicas e, principalmente, elétricas que convivem junto com os dutos e equipamentos e não podem prejudicar a manutenção do sistema de ventilação", destaca o diretor-adjunto da MHA Engenharia Aldo Bianco.


No Brasil, os projetos de ar-condicionado são elaborados com base na norma técnica NBR 16.401 - 08 - Instalações de Ar-condicionado - Sistemas Centrais e Unitários. Esta norma está dividida em três partes, sendo uma delas totalmente dedicada à qualidade do ar interior (parte 3). Ela contém as taxas de ar de renovação mínimas exigidas por tipo de ambiente, filtragens necessárias, além de diretrizes para pontos de tomada de ar externo. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), por sua vez, possui uma portaria específica (3.523/98) para a qualidade do ar no ambiente interno. "Mesmo com todas as diretrizes contidas nas normas, vale lembrar que o projeto deve ser avaliado caso a caso. Portanto, eventualmente o projetista deve majorar valores normatizados para atender às condições específicas de um determinado projeto", ressalva Guilherme Rebello Lourenço, do CTE.


TABELA 1 - CAPTAÇÃO DE AR EXTERIOR: DISTÂNCIA MÍNIMA DE POSSÍVEIS FONTES DE POLUIÇÃO


Locais
Distância mínima
Entrada de garagens, estacionamentos ou drive-ins
5 m
Docas de carga e descarga e estacionamentos de ônibus
7,5 m
Estradas e ruas com pouco movimento
1,5 m
Estradas e ruas com tráfego pesado
7,5 m
Telhados, lajes, jardins ou outras superfícies horizontais
1,5 m
Depósitos de lixo e área de colocação de caçambas
5 m
Locais reservados a fumantes (fumódromos)
4 m
Torres de resfriamento
10 m


Fonte: NBR 16.401 - parte 3


Como tratar um edifício doente
Se a Síndrome do Edifício Doente já apareceu, será preciso chamar um especialista em qualidade de ar para diagnosticar e identificar as causas do problema. "É importante verificar a limpeza de dutos do ar, carpetes, cortinas e outros fatores", recomenda Henrique Cury, presidente do Qualindoor da Abrava.


Além disso, existem novas tecnologias para tratamento do ar que podem ajudar na desinfecção do ambiente, como a fotocatálise. Nesta técnica, são empregados elementos químicos catalisadores que, sob efeito de raios ultravioleta (UV), agem sobre compostos poluentes orgânicos e inorgânicos e sobre micro-organismos, degradando-os e reduzindo a sua concentração no ar a níveis saudáveis.


Outra tecnologia disponível é a de ionização, que lança no ambiente cargas negativas, que se associam às partículas contaminantes em suspensão, carregadas positivamente. "A técnica serve para literalmente baixar a poeira, deixando as partículas mais pesadas se precipitarem", complementa o presidente do Qualindoor.



Manutenção


Em geral, cada componente do sistema possui uma periodicidade de manutenção indicada pelos fabricantes. Condicionadores de ar, geralmente fancoils, recebem manutenção semestral, enquanto dutos são limpos anualmente. Principais elementos responsáveis pela qualidade do ar interno, os filtros exigem uma frequência maior na verificação e manutenção. "Filtros mais eficientes em geral tendem a chegar ao ponto de saturação mais rapidamente do que filtros grossos, sendo recomendável a utilização dos chamados filtros de sacrifício", recomenda o coordenador do CTE.



Lourenço indica o uso de uma ferramenta específica para gestão da atividade, o Plano de Manutenção, Operação e Controle do Sistema de Ar-condicionado e Ventilação Mecânica (PMOC). "Todo sistema de ar-condicionado com capacidade superior a 5 Toneladas de Refrigeração (TR) deve possuir um PMOC. Neste plano, são descritas todas as atividades pertinentes à manutenção do sistema de ar-condicionado, bem com sua periodicidade e atividade a ser realizada, tais como verificação e lavagem de filtros e serpentinas, checagem de pontos de dreno, verificação da bandeja de coleta de água condensada no condicionador de ar, limpeza de dutos e difusores, etc.", frisa o coordenador.



Wadi Tadeu Neaime, presidente do diretório nacional das empresas de instalação e de manutenção da Abrava, explica que o programa é normatizado pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) e regulamentado pela Anvisa. "O programa determina ações como procedimentos eletromecânicos, que garantem o funcionamento seguro e sem quebras prematuras, procedimentos de desobstrução nos pontos de troca de calor, assegurando a eficiência térmica e o consumo de energia elétrica, e procedimentos de limpeza e asseio nos pontos de passagem de ar, garantindo sua movimentação livre de particulados e bactérias indesejáveis", detalha Neaime.


Causas da SED
Em 1989, o instituto norte-americano Niosh classificou as fontes primárias e os agentes geradores da síndrome do edifício doente:

Edificações comerciais


Fotos: Marcelo Scandaroli
Projeto deve prever espaço adequado para realização de limpeza e manutenção do sistema de refrigeração e distribuição do ar


Edifícios residenciais são naturalmente menos afetados, já que suas características construtivas privilegiam, em geral, a ventilação natural e o uso menos intenso dos sistemas de ar-condicionado. Os sistemas de ventilação e de refrigeração de edifícios industriais exigem mais cuidados no tratamento do ar e na filtragem dos poluentes gerados no processo produtivo. Condições insalubres devido às atividades, como altas temperaturas, alta concentração de vapor no processo, umidade elevada e baixa ventilação podem gerar a SED nesse tipo de edifício.



Já os edifícios de uso comercial são, geralmente, mais problemáticos, devido à sua utilização mais intensa e porque, muitas vezes, estão localizados em áreas da cidade mais adensadas e de pior qualidade do ar exterior.


A grande quantidade de materiais e processos afeta também a qualidade do ar, como o uso de carpetes, forros falsos, copiadoras e impressoras, equipamentos eletrônicos, entre outros. Lourenço lembra ainda que, em geral, os edifícios de escritórios no Brasil são dimensionados para uma população de 7 m² por pessoa. A título de comparação, países como os Estados Unidos utilizam taxas de 18 m² por pessoa. "Trabalhamos com populações muito altas, o que gera maiores concentrações de poluentes e CO2 nos ambientes. Além disso, estão associados ao ambiente de trabalho o maior período de permanência durante o dia e um alto metabolismo, devido à concentração exigida para a atividade exercida", explica.


Dutos de chapa
Fotos: Marcelo Scandaroli
Uma estratégia corriqueira de projeto é a utilização de poços de alvenaria como dutos de ar-condicionado. Em muitos casos, também são instalados no interior desses poços equipamentos, cabos, eletrodutos e outras instalações que podem contaminar o ar com outros elementos impróprios. Uma solução para se evitar este tipo de problema é a utilização de dutos de chapa ou outros materiais que trabalhem exclusivamente para o sistema de ar-condicionado, evitando seu uso compartilhado com demais sistemas.


Normas e documentos técnicos




NBR 16.401:2008 - Instalações de Ar-condicionado - Sistema Centrais e Unitários (partes 1, 2 e 3)


Resolução RE-09:2003 da Anvisa, que estabelece parâmetros de qualidade do ar e de renovação a serem respeitados. Segundo a Abrava, há um conflito entre o texto da resolução e a NBR 16.401 referente às taxas de renovação, sendo recomendável seguir as prescrições do documento da ABNT.


NBR 14.679:2001 - Sistemas de Condicionamento de Ar e Ventilação - Execução de Serviços de Higienização


NBR 15.848:2010 - Sistemas de Ar Condicionado e Ventilação - Procedimentos e Requisitos Relativo às Atividades de Construção, Reformas, Operação e Manutenção das Instalações que Afetam a Qualidade do Ar Interior


NBR 13.971:1997 - Sistemas de Refrigeração, Condicionamento de Ar e Ventilação - Manutenção Programada


http://www.revistatechne.com.br/engenharia-civil/184/edificios-saudaveis-para-evitar-a-disseminacao-de-doencas-provocadas-262391-1.asp#


Um comentário:

  1. Olá Laercio!

    Fico feliz em ler que você trata deste assunto tão importante aqui no seu blog. Realmente as pessoas não fazem ideia sobre esta "Síndrome do Edifício Doente". Eu só tive noção do que era e da importância do PMOC Anvisa ao ser síndica do meu prédio por 2 anos. Foi um período difícil (não é fácil ser síndica), mas aprendi muito. E compartilho meu aprendizado com vcs: procurem serviços para o seu prédio que se adequem ao PMOC Anvisa. Segurança em primeiro lugar. E eu tive a sorte de encontrar algo que me ajudou muito e evitou dores de cabeça (sem propaganda, acredito que compartilhar conhecimento é contribuir para o post e para o blog) é o software de manutenção predial Leankeep. Com este software eu tinha noção se faltava algo, se eram necessários reparos e assim por diante. Me ajudou muito. Para quem ficou interessado: http://www.leankeep.com.br/site/pmoc.php :)

    Espero ter contribuído com o post e parabéns pelo blog. Ótimo texto informativo!

    Abraços e beijos,
    Gio

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