Edifícios saudáveis
Para evitar a disseminação de doenças provocadas
pelo ar contaminado, projeto deve seguir prescrições de normas técnicas e
prever planos de manutenção periódica
Débora Prado
A Síndrome do
Edifício Doente ocorre em construções nas quais pelo menos 20% dos
ocupantes apresentam sintomas de doenças relacionadas à má qualidade do
ar interno, que pode ser potencializada pelos sistemas de
ar-condicionado
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Em um primeiro momento, problemas de saúde como dores de
cabeça, fadiga e irritação nos olhos, nariz e garganta parecem não ter
qualquer relação com os aspectos construtivos de uma edificação. Quando
mais de 20% dos ocupantes apresentam esses sintomas, porém, o imóvel
pode ser diagnosticado com a Síndrome do Edifício Doente (SED),
reconhecido em 1982 pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Nesses
casos, a origem do problema pode estar na concepção do projeto da
edificação - principalmente dos sistemas de ar-condicionado - e na falta
de planos de manutenção periódica dos equipamentos.
Com isso, prédios com sistemas de ventilação inadequados são
fortes candidatos a apresentar a síndrome. Segundo o Instituto Nacional
de Saúde e Segurança Ocupacional dos Estados Unidos (Niosh, na sigla em
inglês), entre os diversos agentes causadores da SED, a ventilação
inadequada é a responsável em mais de 50% dos casos.
"Essa síndrome aparece porque várias edificações começaram a
ser construídas de forma hermética, sem ventilação natural, gerando a
necessidade de climatização artificial. Então, se esse sistema de
climatização não opera com eficiência ou fica obsoleto, aparecem
problemas", explica Henrique Cury, presidente do Qualindoor, o
departamento responsável pela qualidade do ar de interiores na
Associação Brasileira de Refrigeração, Ar-condicionado, Ventilação e
Aquecimento (Abrava). "Por isso é importante, ao fazer um projeto,
priorizar a captação de ar externo ou utilizar tecnologias que
substituam isso. E, no caso do uso de ar-condicionado, garantir uma boa
manutenção", indica.
Erros de projeto mais comuns causadores da SED
● Taxa de renovação de ar insuficiente
ou inexistente
● Tomada de ar de renovação posicionada em local inadequado ● Filtragem de ar inadequada para a utilização dos ambientes atendidos ● Salas de equipamentos inadequadamente dimensionadas, que não permitem manutenção e higienização ● Falta de pontos de acesso para limpeza e higienização dos dutos ● Falta de meios de balanceamento dos volumes de ar (registros, dumpers, etc.) ou falta de acesso a eles |
Locais de tomada
de ar externo devem estar distantes de fontes poluidoras como depósitos
de lixo e locais de passagem de veículos
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É possível garantir que a edificação apresente ar de boa
qualidade, desde que alguns cuidados sejam observados na elaboração do
projeto. Alguns fatores associados à qualidade do ar no interior dos
edifícios são bem importantes para serem considerados, como a taxa de
renovação de ar (também conhecida como taxa de ar externo), a filtragem
de ar e as distâncias dos pontos de captação das tomadas de ar externo
de possíveis fontes poluidoras.
Danilo Werneck, diretor técnico da DW Engenharia, ressalta que
no desenvolvimento do projeto é muito importante o cálculo correto das
taxas de renovação de ar, de forma que, para os ambientes ocupados, seja
mantido um nível máximo de 1.000 ppm de CO2.
Para tal, a tomada de ar externo deve ser sempre localizada em
pontos altos, longe de fontes de poluição, filtrados e, se possível,
também desumidificados por um sistema de tratamento primário. "A classe
de filtragem também é importante, de forma a garantir a qualidade
interna do ar. Locais com possíveis pontos de formação de fungos e
bactérias, como bandejas de condensados, devem ser tratados com uso de
dreno que evitem algum condensado retido", indica.
A filtragem do ar é feita em duas etapas: na captação do ar
externo, onde são retidas partículas de grande porte, e nos equipamentos
de condicionamento de ar. Outro item de igual importância é o local
onde é feita a captação do ar externo de renovação, que, por norma, deve
estar a 5 m de distância de quaisquer fontes poluidoras, detalha
Guilherme Rebello Lourenço, coordenador de eficiência energética da
unidade de sustentabilidade do Centro de Tecnologia de Edificações
(CTE).
Responsáveis diretos pela qualidade do ar distribuído pelos sistemas de ar-condicionado, filtros exigem trocas frequentes. Em alguns casos, pode ser necessária a adoção de filtros de sacrifício |
Esses fatores estão diretamente ligados aos principais erros de
projeto que favorecem o surgimento da SED. As taxas de ar externo
abaixo do valor mínimo exigido geram alta concentração de poluentes,
gases e outras substâncias no ambiente, levando, consequentemente, a
problemas como falta de concentração e fadiga no ambiente de trabalho.
Tomadas de ar externo muito próximas às descargas de ar de exaustão,
como sanitários, depósitos de lixo ou passagem de veículos, também
contribuem com o acúmulo de poluentes.
Uma maneira de evitar problemas é prever no projeto a
setorização do sistema de ar-condicionado, evitando a comunicação por
dutos entre ambientes que possuam atividades muito distintas. "Com isso,
é possível selecionar adequadamente o tamanho da serpentina de
resfriamento, pois nela se acumula grande quantidade de água condensada,
proliferando fungos e bactérias. Também deve-se definir as etapas e
classificações de filtragem por tipo de ambiente, levando em
consideração a situação de projeto e operação, isolando sempre que
possível as tomadas de ar externo. Em certos casos, é aconselhável a
utilização de um sistema de lâmpadas ultravioleta (UV) que higienizam a
serpentina dos condicionadores de ar", complementa Lourenço.
Outro aspecto a ser considerado em projeto é a previsão de um
espaço adequado para realização de limpeza e manutenção do sistema de
ventilação. É importante, ainda, lembrar que o ar-condicionado não
existe sozinho e deve ser compatibilizado com outros projetos de
instalações. "Existem instalações hidráulicas e, principalmente,
elétricas que convivem junto com os dutos e equipamentos e não podem
prejudicar a manutenção do sistema de ventilação", destaca o
diretor-adjunto da MHA Engenharia Aldo Bianco.
No Brasil, os projetos de ar-condicionado são elaborados com
base na norma técnica NBR 16.401 - 08 - Instalações de Ar-condicionado -
Sistemas Centrais e Unitários. Esta norma está dividida em três partes,
sendo uma delas totalmente dedicada à qualidade do ar interior (parte
3). Ela contém as taxas de ar de renovação mínimas exigidas por tipo de
ambiente, filtragens necessárias, além de diretrizes para pontos de
tomada de ar externo. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(Anvisa), por sua vez, possui uma portaria específica (3.523/98) para a
qualidade do ar no ambiente interno. "Mesmo com todas as diretrizes
contidas nas normas, vale lembrar que o projeto deve ser avaliado caso a
caso. Portanto, eventualmente o projetista deve majorar valores
normatizados para atender às condições específicas de um determinado
projeto", ressalva Guilherme Rebello Lourenço, do CTE.
TABELA 1 - CAPTAÇÃO DE AR EXTERIOR: DISTÂNCIA MÍNIMA DE POSSÍVEIS FONTES DE POLUIÇÃO
Locais |
Distância mínima
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Entrada de garagens, estacionamentos ou drive-ins |
5 m
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Docas de carga e descarga e estacionamentos de ônibus |
7,5 m
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Estradas e ruas com pouco movimento |
1,5 m
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Estradas e ruas com tráfego pesado |
7,5 m
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Telhados, lajes, jardins ou outras superfícies horizontais |
1,5 m
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Depósitos de lixo e área de colocação de caçambas |
5 m
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Locais reservados a fumantes (fumódromos) |
4 m
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Torres de resfriamento |
10 m
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Fonte: NBR 16.401 - parte 3
Como tratar um edifício doente
Se a Síndrome do Edifício Doente já apareceu, será
preciso chamar um especialista em qualidade de ar para diagnosticar e
identificar as causas do problema. "É importante verificar a limpeza de
dutos do ar, carpetes, cortinas e outros fatores", recomenda Henrique
Cury, presidente do Qualindoor da Abrava.
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Além disso, existem novas tecnologias para tratamento do ar
que podem ajudar na desinfecção do ambiente, como a fotocatálise. Nesta
técnica, são empregados elementos químicos catalisadores que, sob efeito
de raios ultravioleta (UV), agem sobre compostos poluentes orgânicos e
inorgânicos e sobre micro-organismos, degradando-os e reduzindo a sua
concentração no ar a níveis saudáveis.
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Outra tecnologia disponível é a de ionização, que lança no
ambiente cargas negativas, que se associam às partículas contaminantes
em suspensão, carregadas positivamente. "A técnica serve para
literalmente baixar a poeira, deixando as partículas mais pesadas se
precipitarem", complementa o presidente do Qualindoor.
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Manutenção
Em geral, cada componente do sistema possui uma periodicidade de
manutenção indicada pelos fabricantes. Condicionadores de ar, geralmente
fancoils, recebem manutenção semestral, enquanto dutos são limpos
anualmente. Principais elementos responsáveis pela qualidade do ar
interno, os filtros exigem uma frequência maior na verificação e
manutenção. "Filtros mais eficientes em geral tendem a chegar ao ponto
de saturação mais rapidamente do que filtros grossos, sendo recomendável
a utilização dos chamados filtros de sacrifício", recomenda o
coordenador do CTE.
Lourenço indica o uso de uma ferramenta específica para gestão
da atividade, o Plano de Manutenção, Operação e Controle do Sistema de
Ar-condicionado e Ventilação Mecânica (PMOC). "Todo sistema de
ar-condicionado com capacidade superior a 5 Toneladas de Refrigeração
(TR) deve possuir um PMOC. Neste plano, são descritas todas as
atividades pertinentes à manutenção do sistema de ar-condicionado, bem
com sua periodicidade e atividade a ser realizada, tais como verificação
e lavagem de filtros e serpentinas, checagem de pontos de dreno,
verificação da bandeja de coleta de água condensada no condicionador de
ar, limpeza de dutos e difusores, etc.", frisa o coordenador.
Wadi Tadeu Neaime, presidente do diretório nacional das
empresas de instalação e de manutenção da Abrava, explica que o programa
é normatizado pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) e
regulamentado pela Anvisa. "O programa determina ações como
procedimentos eletromecânicos, que garantem o funcionamento seguro e sem
quebras prematuras, procedimentos de desobstrução nos pontos de troca
de calor, assegurando a eficiência térmica e o consumo de energia
elétrica, e procedimentos de limpeza e asseio nos pontos de passagem de
ar, garantindo sua movimentação livre de particulados e bactérias
indesejáveis", detalha Neaime.
Causas da SED
Em 1989, o instituto norte-americano Niosh
classificou as fontes primárias e os agentes geradores da síndrome do
edifício doente:
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Edificações comerciais
Projeto deve prever espaço adequado para realização de limpeza e manutenção do sistema de refrigeração e distribuição do ar |
Edifícios residenciais são naturalmente menos afetados, já que
suas características construtivas privilegiam, em geral, a ventilação
natural e o uso menos intenso dos sistemas de ar-condicionado. Os
sistemas de ventilação e de refrigeração de edifícios industriais exigem
mais cuidados no tratamento do ar e na filtragem dos poluentes gerados
no processo produtivo. Condições insalubres devido às atividades, como
altas temperaturas, alta concentração de vapor no processo, umidade
elevada e baixa ventilação podem gerar a SED nesse tipo de edifício.
Já os edifícios de uso comercial são, geralmente, mais
problemáticos, devido à sua utilização mais intensa e porque, muitas
vezes, estão localizados em áreas da cidade mais adensadas e de pior
qualidade do ar exterior.
A grande quantidade de materiais e processos
afeta também a qualidade do ar, como o uso de carpetes, forros falsos,
copiadoras e impressoras, equipamentos eletrônicos, entre outros.
Lourenço lembra ainda que, em geral, os edifícios de escritórios no
Brasil são dimensionados para uma população de 7 m² por pessoa. A título
de comparação, países como os Estados Unidos utilizam taxas de 18 m²
por pessoa. "Trabalhamos com populações muito altas, o que gera maiores
concentrações de poluentes e CO2 nos ambientes. Além disso,
estão associados ao ambiente de trabalho o maior período de permanência
durante o dia e um alto metabolismo, devido à concentração exigida para a
atividade exercida", explica.
Dutos de chapa
Uma estratégia corriqueira de projeto é a utilização de
poços de alvenaria como dutos de ar-condicionado. Em muitos casos,
também são instalados no interior desses poços equipamentos, cabos,
eletrodutos e outras instalações que podem contaminar o ar com outros
elementos impróprios. Uma solução para se evitar este tipo de problema é
a utilização de dutos de chapa ou outros materiais que trabalhem
exclusivamente para o sistema de ar-condicionado, evitando seu uso
compartilhado com demais sistemas.
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Normas e documentos técnicos
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● NBR 16.401:2008 - Instalações de Ar-condicionado - Sistema Centrais e Unitários (partes 1, 2 e 3)
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●
Resolução RE-09:2003 da Anvisa, que estabelece parâmetros de qualidade
do ar e de renovação a serem respeitados. Segundo a Abrava, há um
conflito entre o texto da resolução e a NBR 16.401 referente às taxas de
renovação, sendo recomendável seguir as prescrições do documento da
ABNT.
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● NBR 14.679:2001 - Sistemas de Condicionamento de Ar e Ventilação - Execução de Serviços de Higienização
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●
NBR 15.848:2010 - Sistemas de Ar Condicionado e Ventilação -
Procedimentos e Requisitos Relativo às Atividades de Construção,
Reformas, Operação e Manutenção das Instalações que Afetam a Qualidade
do Ar Interior
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● NBR 13.971:1997 - Sistemas de Refrigeração, Condicionamento de Ar e Ventilação - Manutenção Programada
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http://www.revistatechne.com.
Olá Laercio!
ResponderExcluirFico feliz em ler que você trata deste assunto tão importante aqui no seu blog. Realmente as pessoas não fazem ideia sobre esta "Síndrome do Edifício Doente". Eu só tive noção do que era e da importância do PMOC Anvisa ao ser síndica do meu prédio por 2 anos. Foi um período difícil (não é fácil ser síndica), mas aprendi muito. E compartilho meu aprendizado com vcs: procurem serviços para o seu prédio que se adequem ao PMOC Anvisa. Segurança em primeiro lugar. E eu tive a sorte de encontrar algo que me ajudou muito e evitou dores de cabeça (sem propaganda, acredito que compartilhar conhecimento é contribuir para o post e para o blog) é o software de manutenção predial Leankeep. Com este software eu tinha noção se faltava algo, se eram necessários reparos e assim por diante. Me ajudou muito. Para quem ficou interessado: http://www.leankeep.com.br/site/pmoc.php :)
Espero ter contribuído com o post e parabéns pelo blog. Ótimo texto informativo!
Abraços e beijos,
Gio