quinta-feira, 29 de novembro de 2012

3º ENAFIT

30º Enafit – Integração de órgãos públicos para combater os acidentes de trabalho foi consenso em Mesa Redonda

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Os participantes do 30º Encontro Nacional dos Auditores-Fiscais do Trabalho – Enafit tiveram a chance de conhecer várias visões sobre o tema “Acidentes de Trabalho no Brasil” durante Mesa Redonda realizada no dia 22 de novembro, em Salvador.  Nortearam o debate a importância da divulgação dos dados de mortes, acidentes e adoecimentos laborais para aplicar políticas públicas, da integração entre os órgãos competentes, da humanização da Justiça do Trabalho e de melhorias nas condições de atuação dos Auditores-Fiscais do Trabalho.
 
A mesa foi composta pela professora da Universidade Federal da Bahia – UFBA, Vilma Sousa Santana, que falou sobre “Subnotificação dos acidentes e doenças do trabalho”; pela Auditora-Fiscal do Trabalho, Célia Soares Koury (PA), que tratou da “Integração dos órgãos de investigação do acidente de trabalho”;  pelo juiz federal do Tribunal Regional do Trabalho – TRT (PI) Francílio  Bíbio Trindade de Carvalho, que desenvolveu o tema “ Repercussões jurídicas de Acidente de Trabalho”, e pelo Auditor-Fiscal do Trabalho Marcos Ribeiro Botelho (MG), que discorreu sobre o “Panorama da Inspeção do Trabalho no Brasil no combate aos acidentes de trabalho”. 
 
Vilma Santana abriu sua exposição dizendo que a atuação da Fiscalização do Trabalho representa um impacto na preservação da saúde dos trabalhadores e os dados produzidos pelos Auditores-Fiscais contribuem para mensurar a incidência de acidentes laborais no país.
 
Segundo ela, o Anuário Estatístico da Previdência Social, que reúne os indicadores de acidentes de trabalho no Brasil possui um alcance limitado e, para ela, registra o equivalente a apenas um terço do número de trabalhadores que morrem por ano. “O fato de não haver dados seguros e precisos faz com que um problema tão importante como esse tenha pouca prioridade no campo das políticas públicas”.
 
Para Vilma, é possível crer que são intencionais a subnotificação e as falhas na divulgação de que os problemas de saúde relacionados ao trabalho têm uma expressividade na epidemiologia, nas mortes, nos adoecimentos e nas incapacidades e que isso implica em custos e em perda de produtividade.
 
A professora comparou a incidência de óbitos por acidente laboral e aqueles causados por tuberculose. Por ano, a cada 190 milhões de habitantes, quatro mil morrem com a doença no Brasil. Já as estimativas do Ministério da Previdência apontam para três mil mortes anuais no ambiente ocupacional para a cada 35 milhões de trabalhadores formais, celetistas, cobertos pelo Serviço de Amparo ao Trabalhador - SAT.
 
Ela explicou que a tuberculose pulmonar é considerada uma doença negligenciada para a qual existem formas de prevenção, tecnologias disponíveis e, no entanto, não se tomam medidas para que o problema seja superado, mesmo com programas de prevenção do Ministério da Saúde e de outros órgãos para onde são destinados recursos. “Mas os acidentes de trabalho, com todo o impacto social, econômico e de sofrimento das pessoas, não é considerado como problema de saúde negligenciado”.
 
Baseada em estudos da UFBA, Vilma afirmou que as cerca de três mil das mortes no ambiente laboral correspondem a 44% dos casos reais. “Podemos projetar, de forma conservadora, que passam de 20 mil as mortes por ano”. De acordo com ela, dos mais de 2 milhões de casos que precisam do auxílio-doença, pago pelo MPS, mais de 300 mil são relacionados ao trabalho, o equivalente a 15,9%. “É um índice alto, mesmo com os problemas da perícia e subregistro da Previdência, deveria ser objeto de prioridade”.
 
Ela apontou que o principal desafio de uma melhor comunicação dos dados sobre acidentes de trabalho é atingir os cidadãos comuns, simplificar a informação e implantar um identificador comum.
 
Integração

“Integração dos órgãos de investigação do acidente de trabalho”foi o tema da apresentação da Auditora-Fiscal do Trabalho Célia Koury. Ela destacou que um dos fatores que impede um melhor planejamento e integração dos órgãos públicos é olhar o trabalhador de forma isolada. “Não observamos o contexto social influenciando no ambiente de trabalho. Se continuar assim, não vai diminuir a incidência de acidentes”.
 
Segundo ela, em 2008, o Ministério da Previdência Social assinou um acordo de cooperação técnica com Ministério do Trabalho e Emprego pelo qual se dispõe a enviar ao MTE, bimestralmente, todos os dados sobre agravos relacionados ao trabalho. “Mas essa não é a realidade. De 2012, por exemplo, não sabemos absolutamente nada”. Célia completou que os dados são tão fechados que os próprios peritos não têm esse conhecimento.
 
Para a Auditora-Fiscal, apesar de alguns avanços, o MTE continua caminhando de forma isolada em determinadas funções. “A atividade da Inspeção do Trabalho se tornou complexa. São 5.984 itens obrigatórios passíveis de autuação e houve incremento de mais 1.948 itens, isso só de Segurança e Saúde”. Ela acredita que esses investimentos não terão retorno enquanto não houver especialização e ampliação do efetivo de Auditores-Fiscais do Trabalho. “Estão vindo técnicas que exigem especialidade. Quem vai nos assessorar nesses estudos? Sem isso, fica mais difícil repassar à empresa como ela deveria se adaptar”.
 
Célia apontou que, em sua visão, a vida do trabalhador está em risco porque desde o início dos anos 2000, após uma queda significativa do número de acidentes, houve um retrocesso com o sucateamento da Auditoria-Fiscal do Trabalho e os índices voltaram a subir. Em 2002, foram registradas 393.071 ocorrências. Em 2010, subiram para 701.496. “E os conhecimentos estão se perdendo com os colegas que se aposentam. Por isso, a necessidade de integração dos órgãos”.
 
Ela lembrou que existe uma Política Nacional de Segurança e Saúde no Trabalho, que reúne vários órgãos para amenizar o problema. “Porém, precisa ser colocada em prática, principalmente com ações de prevenção e promoção na área de SST nas empresas”. A Auditora-Fiscal acrescentou que os grandes empreendimentos precisam se planejar para oferecer condições dignas para os empregados antes de começarem as obras. Ela deu exemplo da construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, em Altamira, no Pará, seu Estado de origem, onde estão ocorrendo vários conflitos sociais, envolvendo inclusive os índios.
 
Célia concordou com a professora Vilma Santana sobre a importância da integração dos órgãos para incrementar a base de dados dos acidentes de trabalho. “Sem a devida visibilidade pública, é como se os dados não existissem. E se não replicarmos os nossos conhecimentos, esses dados serão perdidos”.
 
Papel da Fiscalização do Trabalho

Marcos Botelho abriu sua apresentação sobre o panorama da Inspeção do Trabalho no combate aos acidentes ocupacionais com números. Ele afirmou que, levando em consideração que 85% do quadro atual - cerca de 2.800 - realizam fiscalizações externas, há um Auditor-Fiscal para cada 25.114 vínculos empregatícios.
 
“De 2003 a 2011, o efetivo de Auditores-Fiscais do Trabalho cresceu 9,2% em relação aos 75% de empregos formais no mesmo período”. Segundo ele, essa é uma das principais causas do crescimento de acidentes envolvendo trabalhadores no Brasil. “A consequência para nós é o aumento da carga de trabalho, exigência por análises aprofundadas diante da complexidade de alguns sistemas produtivos”.
 
Marcos lamentou que, como o número de Auditores-Fiscais do Trabalho cai a cada ano por causa das aposentadorias sem a devida reposição do quadro, a categoria não consegue dar uma resposta efetiva na prevenção aos acidentes. “Interditamos, embargamos e os problemas continuam. A culpa é da precarização do órgão”.
 
Ele concordou com Célia Koury que, para atender o incremento de Normas Regulamentadoras – NRs como referência para as autuações, é necessário ter mais Auditores-Fiscais especializados e melhorar a capacitação. “Além disso, o MPS nos requisita análises técnicas para servir de subsídio, assim como o Ministério Público do Trabalho - MPT. A Justiça do Trabalho também nos requisita relatórios de análise”.
 
Para o Auditor-Fiscal, entre os desafios para diminuir a incidência, está a alteração das metas do Plano Plurianual da União. “No PPA, são previstas metas de análise dos acidentes, porém, sem metas de prevenção”. Ele propôs o aumento no valor das multas a serem pagas pelas empresas e mais responsabilidade dos empregadores, mais combatividade dos sindicatos laborais e execução dos Termos de Ajuste de Conduta – TACs. “Queremos mudar o comportamento humano, mas temos que mudar os ambientes de trabalho”.
 
Humanização

O juiz Francílio Bíbio Trindade de Carvalho explicou quais são as competências da Justiça do Trabalho para garantir que os trabalhadores sejam indenizados em ações relativas a danos morais ou materiais nas relações de trabalho.  Afirmou que, de acordo com a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, quem assume os riscos pelos acidentes e doenças ocupacionais são os empregadores.
 
Segundo ele, a responsabilidade civil representava o tripé “dano, culpa e relação de causalidade entre o ato ou omissão no tomador de serviço ou empregador” para que causasse aquele dano. “Todos levavam em consideração apenas o fundamento da culpa, mas independente da lei, as normas evoluem, porque têm que acompanhar a evolução da sociedade”.
 
Então, as análises jurídicas se voltaram também para a culpa presumida, pois  nem sempre o trabalhador, que é a parte hipossuficiente nesta luta desigual entre capital e trabalho, tem condição de comprovar a culpa do empregador. “Na grande maioria das vezes, ele sequer sabe que pode comprovar. Por isso, antes de qualquer transformação legislativa, nós precisamos transformar as nossas mentes”.
 
Ele sugeriu que a Carta de Salvador, elaborada ao fim do 30º Enafit, seja enviada aos juízes do Trabalho para que eles sejam informados das dificuldades enfrentadas pelos Auditores-Fiscais do Trabalho. “Precisamos de mais humanidade na Justiça do Trabalho. A justiça não se forma só de leis, mas de responsabilidade social”.
 
Para o juiz, os Auditores-Fiscais do Trabalho representam um elo importante em relação ao Poder Judiciário, pois atuam mais próximos da sociedade. Também disse que diante da ocorrência de mais de 50 acidentes de trabalho por dia no Brasil, os trabalhadores enxergam os agentes públicos como sua última esperança. “Não existe dignidade e cidadania sem informação. Se o trabalhador não for informado sobre os seus direitos, a situação só vai piorar”, completou Francílio Bíbio.

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