Construção civil foi
considerada trabalho essencial e operários não pararam durante quarentena. De
acordo com sindicato, de 15 mil testados, 28% já tinham anticorpos contra a
doença; destes, 60% não tiveram sintoma algum.
Por Tahiane Stochero, G1 SP
— São Paulo
Ao menos 57 trabalhadores da
construção civil de São Paulo morreram com coronavírus, segundo o sindicato da
categoria. O setor foi considerado atividade essencial e os operários da
construção civil continuaram trabalhando durante toda a quarentena no estado.
Segundo o presidente do
Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil de São Paulo (Sintrcon-SP),
Antonio Ramalho, o número de vítimas pode ser ainda maior pois muitas
construtoras não estão notificando a morte ou a confirmação de casos. Além
disso, diz, há internações e certidões de óbito que apontam a doença como causa
suspeita dos óbitos, sem a confirmação oficial.
Com apoio de incorporadoras,
a entidade conseguiu testar 15 mil funcionários de obras - no total, estima-se
que haja 680 mil trabalhadores na categoria no estado. Conforme Ramalho, dos 15
mil testados, 28% já tinham anticorpos contra a doença sendo que, destes, 60% não
tiveram sintoma algum.
Após a publicação da
reportagem, o Sindicato da Indústria da Construção Civil (SindusCon-SP) disse,
por meio de nota, que o número de 57 óbitos "decorre de uma sondagem
informal" e que "envolve trabalhadores da construção e seus
familiares" (veja a nota na íntegra abaixo).
"Eu não sei se este
dado é positivo ou negativo. É positivo porque mostra que muita gente não
sofreu com a doença. Por outro lado, é negativo porque muitos deles trabalharam
contaminados, repassando o vírus para sabe-se lá quantas pessoas no período de
14 dias de incubação da Covid", disse Ramalho ao G1.
"60% dos testados e que
deram positivo já tinham imunidade e não sabiam", salienta.
Além de 39 funcionários do
setor, o sindicato contabiliza ainda a morte de 11 mulheres, duas crianças
filhos deles e 5 empresários da área. "Lamentavelmente, porém, as empresas
estão escondendo as informações", acrescentou ele.
"Tivemos casos do
segurança de uma obra que pegou a doença e passou para a mulher. Ele teve todos
os sintomas- falta de ar, perda do olfato e do paladar. E se recuperou bem. A
mulher dele morreu em dois dias, aos 35 anos, deixando um filho de 1 ano
idade", disse Ramalho. Em outro caso, o chefe de obras de uma construtora
morreu de Covid-19 - o chefe de obras têm contato com todos os operários, pois
supervisiona a operação.
"Eu disse ao ministro
da Economia, Paulo Guedes, certa vez: é de se questionar o motivo da construção
civil ser serviço essencial. É essencial porque movimenta a economia, mantém
empregos, e um grande número. Mas não é essencial do ponto de vista de
necessário, ninguém come pedra brita, tijolo, cimento", brinca o
presidente do Sintrcon-SP.
Com apoio de fiscais do
Ministério Público do Trabalho (MPT) e do Ministério do Trabalho e Emprego,
agentes do sindicato têm vistoriado obras para as quais haja denúncias de
desrespeito às regras acordadas entre a categoria e os empregadores em março,
buscando evitar a propagação do coronavírus. Pelo acordo, que foi incorporado à
convenção coletiva da categoria, as obras deveriam fornecer aos operários
máscaras de proteção, álcool em geral, fazer o distanciamento social e a
testagem dos funcionários pela doença.
Só na capital paulista, o
MPT já recebeu 8 denúncias de obras em que há desrespeito às recomendações das
autoridades brasileiras e internacionais para evitar à propagação da doença.
Em um dos casos, um canteiro
de obras com 1.200 operários foi paralisada pelo sindicato em 13 de maio na
Chácara Santo Antônio, na Zona Sul de São Paulo. Após notificação do sindicato,
a construtora é fiscalizada em caso de descumprimento das regras de segurança e
de higiene e é aberta uma investigação pelo MPT.
"Vimos em uma obra um
elevador com 60 operários, sendo que a recomendação era para os elevadores não
levarem mais de 20. Recomendações aos funcionários para que, em construções de
até 10 andares, eles optassem pelas escadas, para evitar aglomerações",
afirmou Ramalho.
"Em muitas obras
fiscalizadas encontramos operários jogando cartas e truco nos vestiários nos
intervalos, sendo que nossa recomendação era para que ficassem a uma distância
de 2 metros um do outro. Há também dificuldade em mantermos as condições de higiene
em algumas construtoras: encontramos construção com uma pia para 50 operários.
Isso é desumano", disse o presidente do sindicato.
O presidente do sindicato
dos operadores da construção civil paulista acredita, porém, que há condições
da categoria continuar trabalhando, desde que as recomendações das autoridades
de saúde sejam cumpridas pelas empresas.
"O grande problema de
tudo isso é que não houve conversa com a categoria antes de mantermos como
serviço essencial. As coisas foram feitas de forma corrida, sem diálogo.
Demorou-se para se adquirir equipamentos de proteção e a se tomar medidas. A
máscara que o operário usa na rua não é a mesma da obra, são duas diferentes.
Eu acho que há condições de se continuar trabalhando, desde que façamos testes
em massa e que haja a medição da temperatura dos operários nas construções,
além das medidas de prevenção", acrescenta Ramalho.
Veja
a nota do SindusCon-SP:
Lamentamos profundamente os
óbitos ocorridos entre os 650 mil trabalhadores formais da construção paulista.
O número 57 decorre de uma
sondagem informal. Envolve trabalhadores da construção e seus familiares, e
abrange todo o período desde o início da pandemia.
Não há evidências de que as
perdas indicadas, assim como os contágios relatados, estejam ligados
diretamente às atividades profissionais nas obras, podendo também ter se
originado nas residências ou em outros locais.
Desde o início da pandemia,
Sintracon-SP, SindusCon-SP e Seconci-SP instalaram um Comitê Permanente para
zelar pela saúde dos trabalhadores e pela manutenção de seus empregos. Junto
com a Abrainc e o Secovi-SP, empreenderam uma série de ações de conscientização
de empregadores e trabalhadores.
Estas ações, feitas por meio
de vídeos, folhetos, cartazes e um Guia Orientativo, preconizam medidas
rigorosas nos canteiros de obras, como: medição de temperatura, higienização
constante das mãos e dos Equipamentos de Proteção Individual, uso de máscaras
na obra e nos trajetos de ida e volta, evitar aglomerações na entrada e saída,
nas área de convivência e nos elevadores, entre outras.
Para aferir o andamento
destas ações, o SindusCon-SP e o Seconci-SP iniciaram uma enquete e divulgaram
os primeiros resultados relativos a 0,2% dos trabalhadores da capital paulista.
Entre as empresas respondentes, registrou-se alta adesão às medidas protetivas
e nenhuma registrou óbito no período de 1 a 12 de maio.
Novas rodadas da pesquisa
serão feitas nas próximas semanas, para que as entidades, os trabalhadores e as
construtoras possam acompanhar a evolução da pandemia e seguir adotando todos
os cuidados necessários à preservação da saúde.
Pesquisa realizada pela
Abrainc com 23 empresas sediadas no Estado de São Paulo envolveu 28.198
colaboradores trabalhando em 381 canteiros (93% do contigente total). Essa
amostra registrou 361 (1% do total) de trabalhadores infectados (realizaram
teste positivo), 13 dos quais (0,05% do total) foram internados. Foram apurados
3 óbitos (0,01% do total). Todas trabalham com as rígidas regras de saúde e
segurança mencionadas acima.
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