Segundo
a Organização Internacional do Trabalho, o problema não é tratado da forma
correta. Para Justiça, dispensa é trocada por tratamento.
Diego Amorim /Correio Braziliense
Brasília
– Fernando* não se considera alcoólatra. “Eu? De jeito nenhum”, responde,
convicto. Tem 25 anos e trabalha na área administrativa de um cartório da
capital do país. Bebe – sozinho ou com os amigos – pelo menos três vezes por
semana. Perdeu a conta dos dias em que bateu o ponto virado da farra na noite
anterior, de ressaca ou, como ele diz, “doidão mesmo”. Certa vez, recorda aos
risos, dormiu por quase uma hora no chão do banheiro do cartório, abraçado ao
vaso sanitário para uso exclusivo de deficientes físicos. “Ali é mais
espaçoso”, justifica.
O
álcool responde por 50% das ausências no serviço, segundo a Organização
Internacional do Trabalho (OIT). Encarado, quase sempre, de forma engraçada ou
velada, o alcoolismo mina a produtividade no cartório onde Fernando trabalha e
em milhares de empresas e órgãos públicos brasileiros. As consequências vão
muito além dos atrasos e faltas motivadas pela ressaca. O mau uso da bebida –
que atinge todos os cargos e níveis – favorece acidentes, afastamentos por doenças
e situações em que o funcionário está presente, mas não usa todo o potencial.
“Em
um mundo cada vez mais competitivo, o alcoolismo provoca prejuízos
imensuráveis, afetando a lucratividade das empresas”, sentencia Rita Brum,
diretora da Rhaiz Soluções em Recursos Humanos. Cerca de 5% dos que assumem
beber com frequência — um universo de 4,6 milhões de pessoas — já perderam o
emprego no Brasil devido ao consumo exagero de álcool, de acordo com o
levantamento mais recente do Instituto Nacional de Políticas Públicas do Álcool
e Outras Drogas (Inpad) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). A
demissão por embriaguez, prevista na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)
como justa causa, tem sido condenada pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST),
que recomenda o afastamento do trabalhador.
Na
Justiça Se antes a legislação brasileira permitia ao empregador demitir por
justa causa um funcionário alcoólatra, agora a empresa corre o risco até de
pagar indenização por dano moral à pessoa dispensada por esse motivo. “A
embriaguez habitual é considerada doença. O colaborador precisa ser afastado do
serviço, ter o contrato suspenso e receber o auxílio-doença”, afirma o
desembargador José Eduardo de Resende Chaves Júnior, do Tribunal Regional do
Trabalho da 3ª Região (Minas Gerais).
O
artigo 482 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em vigor desde 1943,
mantém a embriaguez como motivo para a demissão por justa causa. A norma não
foi alterada, mas, nos últimos anos, o entendimento da Justiça caminhou no sentido
oposto, aplicando indenizações que variam de acordo com o porte da empresa. “Se
a pessoa doente perde o emprego, isso vira mais um motivo para ela beber”,
esclarece o desembargador.
Tânia*,
49 anos, foi demitida duas vezes em razão do alcoolismo: a primeira de uma
indústria de cerâmica em Santa Catarina; a segunda, da casa onde era doméstica.
“Já dormi na escada do prédio dos patrões de tão embriagada. Não consegui
chegar ao apartamento”, conta a mulher. Atualmente, Tânia frequenta os
Alcoólicos Anônimos. Largou o vício há 13 anos e voltou a trabalhar. Para a
empresa, a melhor estratégia é estender a mão ao colaborador.
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